São Paulo, sábado, 27 de março de 2010

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TENDÊNCIAS/DEBATES

O Congresso Nacional deve aprovar o Procultura?

SIM

Uma bandeira para o teatro

NEY PIACENTINI

NESTE DIA 27, Dia Mundial do Teatro, as artes cênicas no Brasil, se ainda não têm o que comemorar, têm pelo que lutar.
Após 15 anos da retomada da politização do debate no teatro nacional, que se reiniciou na década de 90 com o movimento Arte contra a Barbárie na cidade de São Paulo, foi criado no novo projeto de lei para a cultura do país, o Procultura, que está no Congresso Nacional, um fundo setorial para as artes cênicas, e foram lançadas, no mesmo projeto, as bases de um programa nacional para o teatro.
Trata-se de um grande avanço, visto que, desde a interrupção pela ditadura do histórico período em que a cultura brasileira tinha amplo diálogo com a sociedade, não se tem perspectiva de o teatro voltar a fazer parte da vida da população do país.
A plataforma nacional é baseada na experiência do Programa Municipal de Fomento ao Teatro para a Cidade de São Paulo, lei 13.279. Implantado em 2002/2003, o programa mudou a geografia teatral da cidade, descentralizando a produção e o acesso da população ao teatro na capital e exigindo dos contemplados contrapartida social e real inserção nas comunidades onde os projetos são realizados.
O programa nacional, de nome Prêmio Teatro Brasileiro, tem três bases: fomento a grupos e companhias teatrais em todo o país; estímulo à produção teatral por meio de montagens de espetáculos não necessariamente ligados a núcleos estáveis; difusão e circulação de trabalhos teatrais em todo o país.
Quando, em 2008, os editoriais dos grandes jornais do país abriram espaço para debater duas propostas para o teatro brasileiro, uma baseada em fundo público e outra em renúncia fiscal, houve quem não entendesse o teor da ideia que acabou vingando.
Falou-se que o projeto defendido por movimentos teatrais, cooperativas e entidades próximas à produção teatral coletivizada não incluiria os produtores sem vínculos à referida base. Ou seja, produtor e empresas de produção que não fizessem parte do escopo de grupos e companhias não teriam acesso ao programa.
Como se pode ver no projeto de lei, que, do nosso ponto de vista, precisa ser aperfeiçoado, isso não corresponde à realidade: "Artigo 66. Fica instituído o Programa Prêmio Teatro Brasileiro, que precisa ser definido em regulamento, para fomentar: I -núcleos artísticos teatrais com trabalho continuado; II - produção de espetáculos teatrais; e III - circulação de espetáculos ou atividades teatrais".
O inciso II do artigo 66 faz jus ao pleito de um setor significativo da produção nacional.
Outro temor dos produtores seria o critério de escolha na concorrência pública dos projetos a serem contemplados. De acordo com as diretrizes levantadas pelos movimentos teatrais do país, o julgamento deve ser feito por comissões paritárias entre órgãos do governo e representantes da sociedade, com notório saber na área, eleitas pelas representações reconhecidas da categoria, cujo critério central seria o mérito cultural dos projetos.
Existe um argumento de que essas comissões podem ser tendenciosas e excluir aqueles que não estejam alinhados com a ideologia do governo de plantão. Ora, para evitar que os governos sejam os únicos com poder de escolha é que se propõe a paridade com a sociedade civil.
E mais, se esses delegados da sociedade puderem ser escolhidos a partir das entidades que representam legitimamente a categoria, cabe aos agentes teatrais se dirigir às suas representações para garantir o direito de participação nesse processo de escolha de possíveis membros das comissões julgadoras.
Nenhum procedimento é totalmente perfeito, e o tempo molda os problemas que venham a surgir no percurso de implantação de uma nova política para a cultura no Brasil.
Mas, depois de 15 anos de discussões por todo o país, o que está no Congresso, no que diz respeito ao teatro brasileiro, foi o melhor que o setor produziu e da maneira mais democrática possível.
Cabe à comunidade cultural fazer aprovar o projeto e acompanhar de perto a sua instalação, como uma aposta em um novo tempo para o teatro no Brasil.


NEY PIACENTINI , 49, é ator da Companhia do Latão e presidente da Cooperativa Paulista de Teatro.

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