São Paulo, terça-feira, 27 de abril de 2004

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DEMOCRACIA NA CORTE

Nas próximas semanas, os Estados Unidos poderão dar ao mundo mais uma mostra do vigor de sua democracia ou, contrariamente, evidenciar que sucumbiram às forças obscurantistas do terrorismo e perderam um dos aspectos mais essenciais do Estado democrático, que é a capacidade de preservar os direitos individuais.
A Suprema Corte federal está analisando alguns casos paradigmáticos de pessoas acusadas de terrorismo. O mais notável deles é o de um grupo de prisioneiros estrangeiros capturados no Afeganistão e mantidos encarcerados na base norte-americana de Guantánamo, em Cuba, que reclama o direito de fazer-se ouvir pela Justiça dos Estados Unidos.
No pacote de medidas antiterroristas aprovado após o 11 de Setembro, deu-se ao Executivo amplos poderes de ação. Tão vastos que o governo se julgou no direito de recusar aos detidos de Guantánamo, muitos deles presos há mais de dois anos sem acusação formal ou acesso a advogados, até as proteções mínimas previstas nas Convenções de Genebra. Em princípio, eles poderão ser submetidos a juízos sumários em tribunais militares de exceção.
A argumentação do Executivo, corroborada por uma corte de apelações federal, é kafkiana: como os presos de Guantánamo não têm cidadania norte-americana nem estão em território dos EUA, não têm direito a nenhuma das proteções previstas na Constituição. Há aí um verdadeiro escândalo jurídico, pois o fato de os presos não estarem em território americano é menos do que uma formalidade geográfica. Eles estão na ilha de Cuba, mas sob custódia de forças americanas e numa base militar que ostenta a bandeira dos EUA, sobre a qual o governo cubano não exerce, obviamente, nenhuma espécie de poder ou de soberania.
O mundo está atento a esses julgamentos, que definirão se os EUA vão honrar suas tradições democráticas ou se irão maculá-las sob o pretexto de defender a segurança nacional.


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