São Paulo, domingo, 27 de junho de 2004

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ELIANE CANTANHÊDE

A lei do mais forte

BRASÍLIA - Os 31 mortos na chacina da Casa de Custódia de Benfica, no Rio, eram em geral negros, mulatos e pobres. Pés-de-chinelo, não tinham onde cair mortos. Muitos foram presos por pequenos crimes, como jogar pedras em carros ou roubar tênis em shopping, celular na rua, mochila de turista. Alguns já tinham cumprido pena, continuavam jogados ali ninguém sabe bem por quê.
Enquanto isso, no outro Brasil, o ministro Marco Aurélio de Mello, do Supremo, anuncia uma decisão "técnica", mandando soltar os acusados do "propinoduto", escândalo que surrupiou mais de US$ 30 milhões dos brasileiros.
A lei (que manda soltar presos não condenados em última instância depois de um certo prazo) não valeu para os pés-de-chinelo que acabaram em cova rasa. Mas valeu para os que capricharam no seu pé-de-meia à custa do erário e que estão por aí, vivíssimos, numa boa.
O Congresso está para aprovar a reforma do Judiciário e introduzir algum tipo de controle externo sobre um Poder que corre solto. Mas o contraste da Justiça não é isolado. Ao contrário, é igualmente reflexo e causa da desigualdade crônica e sempre chocante entre a elite e os trabalhadores e, principalmente, os miseráveis. Exemplos bem fresquinhos:
1) O Brasil passou a ter 5.000 novos milionários (com US$ 1 milhão ou mais) em 2003, primeiro ano do governo Lula, enquanto a renda média do trabalhador caiu 14%.
2) O salário mínimo de R$ 260 foi aprovado pelo Congresso na semana passada e comemorado como "vitória" do governo Lula. Mas a redução do número de vereadores está em banho-maria e o patrimônio dos deputados estaduais do Rio multiplicou-se entre 1996 e 2001.
Segundo "O Globo", esse aumento foi de mais de 100% para 27 dos deputados e, em alguns casos, chegou a 1.000%. Haja competência política, empresarial e administrativa!
Quem pode pode. Quem não pode que se dane. Na Justiça, na renda, na vida e até na morte.


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