São Paulo, sábado, 27 de junho de 2009

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CLÓVIS ROSSI

Somos todos "subprime"?

BASILEIA - Quando nos mudamos para Madri, em 1992, para que eu assumisse o posto de correspondente desta Folha, meus filhos, já passados dos 20 anos, descobriram uma coisa chamada crédito.
Explico: todos os três haviam crescido com aquela obscena inflação brasileira, o que tornava pedir dinheiro emprestado uma ousadia fora dos planos de qualquer um que tivesse bom senso -a menos, claro, que seu nível de renda fosse bastante confortável.
Dois anos depois, veio o Plano Real, a economia foi se estabilizando, se estabilizando e um ou dois solavancos posteriores não alteraram o essencial: os preços tornaram-se suficientemente civilizados para que uma importante fatia de brasileiros descobrisse o que meus filhos tiveram que aprender apenas no exterior: crédito é uma coisinha basicamente simples e que irriga qualquer economia.
Até aí, portanto, a informação de ontem do Banco Central de que o nível de endividamento das famílias atingiu 34,8%, um recorde, pode ser lida como positiva. Saiu-se de um nível "incipiente" de crédito, segundo o próprio BC, para um patamar consistente.
O problema começa quando se olha para outro dado também do BC: a taxa de inadimplência nas operações dos bancos com pessoas físicas chegou a 8,6% em maio, recorde da série histórica iniciada em junho de 2000.
Em um país com renda muito baixa, como continua sendo o Brasil, e em que se toma dinheiro olhando se a prestação cabe no bolso, e não para a taxa de juros cobrada pelos bancos, há o risco de que muita gente vire "subprime", aquele pessoal que comprou casas sem ter renda suficiente para tanto e acabou sendo o embrião da mais grave crise econômico-financeira do planeta em 60 anos.
Seria uma tremenda maldade com uma sociedade asfixiada durante tanto tempo pela inflação.

crossi@uol.com.br


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