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JOÃO SAYAD
Milton Friedman
NA SALA , sentados no chão
em semicírculo, um xiita e
um sunita, rostos cobertos
e metralhadoras, um judeu de barba, tranças e roupas do século 18,
um encapuzado da Ku-klux-kan,
um TFP de terno e crucifixo na lapela e um neoconservador americano. É uma palestra sobre tolerância.
Não participe! Contra o fundamentalismo, só existe uma alternativa -mais fundamentalismo. Se
for debate apenas com pessoas de
bom senso, também não vale a pena. A menos que você aceite fazer o
papel de radical. A receita para
bons debates é simples, mas desagradável: uma colher de sopa bem
cheia de moderados e uma pitada
de radicais ácidos com sabor marcante, que permanece na boca depois da degustação. Friedman
morreu. Saudades da polêmica, da
criatividade e do brilho.
Argumentou a favor do câmbio
livre. Com câmbio fixo, o Banco
Central age como especulador,
comprando e vendendo dólares a
um preço fixo, apostando que dá
certo. Se a taxa fixada não equilibrar as contas externas e se desvalorizar de repente, os burocratas
do BC não perdem dinheiro. Não
tem incentivo para acertar. Só vaidade, o que não é pouco, mas não
lhes custa nada. Com câmbio livre,
os especuladores que erram perdem dinheiro e desaparecem. Os
que acertam ganham dinheiro. Sobram no mercado apenas os bons
especuladores que advinham a taxa cambial de equilíbrio. Brilhante.
Mas falso. Logo se demonstrou que
maus especuladores podem ganhar muito dinheiro desestabilizando a taxa cambial. Portanto o
câmbio flutuante pode ser tão instável quanto o fixo. Com a globalização financeira, a melhor solução
é, de fato, o câmbio flutuante, pois
o Banco Central é mau especulador. Taxas flutuantes é apenas o
menor dos males (o prejuízo não é
pago pelo Tesouro).
Defendeu o controle da quantidade de moeda para combater a inflação. Não definiu o que era moeda-poderia ser qualquer coisa que
comprovasse a teoria. Foi um inovador em econometria que virou
metodologia de guerra para vencer
a discussão.
Sua contribuição é inestimável,
assim como a de muitos discípulos
ganhadores do Prêmio Nobel. Era
um tempo em que os professores
da Universidade de Chicago, ele à
frente, discutiam economia dispostos a tudo para vencer.
Na era pós-moderna, o discurso
é relativista, embora o poder pertença, como sempre, aos fundamentalistas. A economia sobrou como única área, além das religiões, a falar em "fundamentos".
Hoje, Friedman seria um estorvo,
um fedayeen entre muitos fedayeen. Saudades do pensador brilhante e radical e do tempo em que
os radicais faziam falta.
jsayad@attglobal.net
JOÃO SAYAD escreve às segundas-feiras nesta
coluna.
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