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MARCELO BERABA
Tortura em paz
RIO DE JANEIRO - A Polícia Federal
ficou completamente desmoralizada
ao não apontar os assassinos do auxiliar de cozinha Antônio Gonçalves
de Abreu. Preso no dia 7 de setembro,
ele foi torturado e morto dentro das
dependências da própria PF do Rio.
O inquérito policial confirma a tortura e o assassinato, mas não revela os
autores dos crimes.
Num caso como esse, é impossível
acreditar que tenha havido incompetência nas investigações, porque todos os fatos ocorreram na polícia e todos os protagonistas são policiais
identificados. É um crime relativamente fácil de ser apurado. Prevaleceu, mais uma vez, o espírito de corpo
alimentado pela certeza da impunidade.
A fleuma do superintendente regional da PF é impressionante. É como
se a morte de um prisioneiro sob a
guarda do governo só tivesse a ver
com os carcereiros. No governo ditatorial do general Geisel, há quase 30
anos, o comandante do 2º Exército
foi destituído depois das mortes do
jornalista Vladimir Herzog e do metalúrgico Manuel Fiel Filho porque
ficara comprovado que havia perdido o controle da carceragem.
Palavras do superintendente: "Há
uma situação real e uma ideal. Temos de trabalhar com base em provas". Belíssima lição. Mas inútil, porque não explica como os seus pares
não conseguiram transformar as evidências em provas.
Difícil saber o que é mais admirável
no caso: se a "incompetência" dos policiais responsáveis pela apuração
dos crimes ou a competência dos responsáveis pela sua ocultação.
É bom que a reação mais forte, desde o início do caso, esteja vindo do
próprio governo FHC, por meio do
Ministério da Justiça, que já reconheceu o crime e aprovou uma pensão
para a família do morto, e do seu secretário de Direitos Humanos, Paulo
Sérgio Pinheiro, que condenou as
conclusões indefensáveis da PF: "A
investigação é patética".
Detalhe: a PF é subordinada ao Ministério da Justiça.
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