São Paulo, sábado, 28 de fevereiro de 2004

Próximo Texto | Índice

A CRISE DE CHÁVEZ

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva abreviou sua permanência na Venezuela. A decisão poderia ser interpretada como uma tentativa de evitar a consolidação da imagem de que o governo petista estaria inclinado a formar com o líder cubano Fidel Castro e o venezuelano Hugo Chávez um eixo anti-Washington na América Latina. Se correta a interpretação, ela marca um momento de bom senso da diplomacia brasileira, que nada teria a ganhar com esse tipo de alinhamento.
A Venezuela passa por um período de turbulência. Novos distúrbios ocorreram ontem no país. A atuação do intempestivo populista Hugo Chávez vai se comparando a um mau roteiro de filme sobre repúblicas de bananas na América Latina. Ele está prestes a invalidar, pela terceira vez, a tentativa da oposição de convocar um referendo que poderia acabar reduzindo o seu mandato.
Mais uma vez, o governo se aferra a tecnicalidades que dão um toque kafkiano ao processo. Agora, o Conselho Nacional Eleitoral, no qual três dos cinco conselheiros são ligados ao presidente, exige que todos os eleitores que tenham assinado a petição do plebiscito, mas que não preencheram de próprio punho os dados pessoais, comprovem, num prazo de cinco dias, as suas firmas.
Com a nova e extemporânea demanda -que afeta cerca de 1 milhão das 3 milhões de assinaturas apresentadas- aumentam muito as chances de que não se atinja o patamar de 2,4 milhões (20% do eleitorado) de firmas válidas necessárias para que se convoque o referendo.
É até possível que a oposição se tenha valido de fraudes, como acusa Chávez. O fato, porém, é que a Venezuela está cindida e imobilizada por uma crise que parece difícil de ser administrada até o próximo pleito, em 2006. Em vez de prender-se a artimanhas burocráticas, que apenas eternizam a instabilidade, o líder venezuelano deveria ter a coragem e a grandeza de aceitar o referendo. Perca ou não, ganham a democracia e a Venezuela. A alternativa é levar o confronto a uma ruptura tão previsível quanto danosa para o país e o continente.


Próximo Texto: Editoriais: FORTES INDÍCIOS
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.