São Paulo, sexta-feira, 28 de junho de 2002

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CLÓVIS ROSSI

Terrorismo face 2

SÃO PAULO - Pode ser eleitoralmente conveniente e jornalisticamente charmoso culpar José Serra por todos os esquemas de espionagem, supostos e reais, que vão virando notícia.
Mas pode ser também um tremendo erro de foco. Refiro-me, em particular, a um esquema que, comprovadamente, é real: o que investigou durante um ano e meio Luiz Inácio Lula da Silva.
Data do início da investigação: dezembro de 2000. É pouco razoável supor que, naquela época, Serra estivesse empenhado em vigiar Lula ou qualquer outro futuro adversário. Estava, isto sim, preocupado com os "inimigos internos", no governo e no partido, que se opunham à sua candidatura -e não eram poucos.
Se é pouco razoável fazer retroagir o esquema Serra a dezembro de 2000, tem-se o seguinte cenário: um delegado da Polícia Federal usa, indevidamente, papel timbrado da CPI do Narcotráfico para mandar investigar Lula. O pretexto é a denúncia telefônica de um sujeito que diz ter sido prefeito de São Bernardo (nunca foi).
Um policial minimamente curioso, característica básica da profissão, mandaria verificar se o denunciante fora mesmo prefeito. Verificada a mentira, o denunciante perderia credibilidade no ato.
Como princípios básicos não foram observados, a lógica manda supor que o esquema de espionagem sobre Lula só possa ter duas raízes: é resquício no aparelho de Estado da teoria do inimigo interno, que provocou todos os conhecidos abusos praticados durante o ciclo militar, e/ou é o uso da polícia para entrar no lucrativo negócio dos dossiês.
Em qualquer caso, é crime grave. Caracteriza um segundo tipo de terrorismo, além do terrorismo financeiro escrachado que se vê nos mercados. Se os demais candidatos e o governo preferirem o silêncio, não só serão cúmplices como perderão o direito a queixar-se se e quando virarem vítimas, como aconteceu no episódio dos grampos do BNDES.


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