São Paulo, sexta-feira, 28 de junho de 2002

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JOSÉ SARNEY

Lula, grampo e Pr.

Pelo Brasil inteiro, o futebol e a democracia fazem a festa., Para aumentar a motivação, no Nordeste entra o São João com toda a força de sua alegria. As convenções partidárias formam um espetáculo à parte. Os partidos pequenos, sem recursos nem meios para grandes festas, mobilizam vocações políticas e, na simplicidade de seus diretórios, entram no jogo. São milhares e milhares de candidatos que, sem nenhuma chance, desejam participar e fazem o seu papel de figurantes. Nas grandes legendas, vale desde o show hollywoodiano do PSDB, em Brasília, que custou declarados R$ 500 mil, preço das lâmpadas e adereços, até a convenção do PFL, que não gastou nada porque simplesmente não realizou convenção.
Mas a democracia brasileira está manchada por vergonhosa volta a métodos mexicanos dos anos 50. É inacreditável que a polícia grampeie por 18 meses os dirigentes do PT e que o ministro da Justiça diga que não é grampo, é "interceptação telefônica".
Como toda "armação", a "legalidade" invocada é uma inacreditável conjunção de fraude com má-fé. Aliás, o método já é bem conhecido. Uma área de sombra do governo tem interesse em destruir determinada pessoa ou situação para facilitar o seu caminho. Simula-se uma investigação sigilosa. A motivação, para tomar uma aparência de legal, é manipular denúncias e incluir telefones de políticos contrários entre apuração de narcotráfico. Lula não foi o primeiro.
Essa prática começou ao lado do gabinete do presidente. Queriam demitir o embaixador Júlio César Gomes do Santos, chefe do cerimonial. Um delegado mandou incluir o seu telefone numa escuta de investigação de narcotraficantes. Resultado: envolveram-no na trama do Sivam, e ele amargou o diabo. Nessa época, quando a "IstoÉ" tinha as fitas, o presidente mandou chamar dois jornalistas da revista para tentar adiar a matéria. Perguntou quem tinha conhecimento dela. Um deles, que já estava trabalhando na matéria, disse que era o senador Sarney, porque era presidente do Senado e a ele tinha sido feito um dos telefonemas do embaixador Júlio César, em que perguntava quando entraria em pauta o projeto. "Nós o procuramos para confirmação", disse o jornalista. O presidente ficou desolado: "Logo o Sarney ter conhecimento!". E, como se estivesse surpreso, escorregou: "Nós deveríamos era manter o grampo por mais um mês para ver se o pegávamos". O jornalista contou-me essa história. Eu não acreditei...
O aparato estatal está a serviço da política. Até o deputado José Dirceu, que tem uma biografia de lutas e de honestidade, está sentindo na carne esse procedimento. O senador Jorge Bornhausen também está sendo vítima dessa ação ditatorial e fascista porque levou o PFL a romper com o governo.
O que ocorre no seio do governo não se apura nem se grava. É a lei do abafa.
Mas pena mesmo temos do presidente. Ele não sabe de nada. Ele não sabia da crise de energia, ele não sabia do aumento da gasolina, nem da operação com o Banco Marka, nem do Proer. Recomendou à seleção: "Sapato alto não pode, grampo sim".
Ele, coitado, ficou indignado com as matanças de São Paulo. Ficou revoltado com a metralhada à Prefeitura do Rio. E, para saber se aquilo tudo era verdade, foi àquela cidade, recolheu algumas cápsulas (cartuchos de balas), cheirou e perplexo constatou:
"É pólvora! Que absurdo!".


José Sarney escreve às sextas-feiras nesta coluna.



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