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MARCOS NOBRE
Photoshop na política
MORREU NO último sábado, aos 83 anos, o ex-primeiro-ministro francês
Raymond Barre, que descrevia a si
mesmo como "um espírito quadrado em um corpo roliço". Já o atual
presidente, Nicolas Sarkozy, 52, do
mesmo campo político da direita,
teve uma foto sua retocada pela revista "Paris Match" para eliminar
uns "pneuzinhos".
Entre a corpulência de Barre e o
Photoshop de Sarkozy, muita coisa
mudou na política francesa. A começar por uma mudança geracional. Sarkozy insiste em quebrar um
a um todos os rituais estabelecidos
há pelo menos 50 anos. Decidiu
promover políticos muito jovens a
posições centrais no governo.
Também cooptou quadros políticos da esquerda e do centro.
Encabeçou vários lances diplomáticos sensacionalistas desde a
posse, em maio. Mesmo se seu primeiro discurso de política externa
de ontem tem indicações de continuidade com a tradição diplomática francesa do pós-Guerra, projeta
também um alinhamento com os
EUA que é novo.
É o primeiro presidente francês
realmente midiático: sabe dizer
uma coisa e seu contrário em uma
mesma frase e pensa todos os seus
passos em termos da cobertura jornalística que vai alcançar. Ganhou
as eleições mesmo chamando os
jovens que protestavam na periferia de Paris de "escumalha" e se dizendo inclinado a pensar que "se
nasce pedófilo".
Essa transformação do panorama geral da política francesa começou nas eleições de 2002, quando o
candidato socialista, Lionel Jospin,
não conseguiu ir para o segundo
turno. Naquela oportunidade, quase todas as forças de direita se reuniram em torno da União por um
Movimento Popular (UMP) para
enfrentar o candidato ultradireitista Jean-Marie Le Pen.
Os resultados eleitorais desfavoráveis de 2002 e de 2007 abriram
uma crise no Partido Socialista
francês que tem muito a ver com
essas mudanças. O relativo fracasso da candidata Ségolène Royal nas
eleições presidenciais deste ano
mostrou que também os políticos
socialistas acima de 55 anos não
têm mais lugar.
O Brasil não está muito longe
dessas mudanças. Com exceção de
um ou outro nome, a velha guarda
de políticos está dando lugar a uma
nova geração que se orgulha de seu
pragmatismo e da ausência de referenciais ideológicos.
Sarkozy tem o sólido apoio do
empresariado e de um conservadorismo unificado. Mas seus lances
midiáticos são por vezes tão arriscados e personalistas que é de pensar se ele ainda não vai acabar isolado um dia desses. Com uma outra
aliança e uma outra correlação de
forças, é exatamente o risco que
corre Lula todos os dias. Um risco
que Photoshop nenhum consegue
eliminar.
MARCOS NOBRE escreve às terças-feiras nesta coluna.
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