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CLÓVIS ROSSI
O horror e a ternura
SÃO PAULO - O leitor César Danilo Ribeiro de Novais puxou ontem
Guimarães Rosa para falar das touradas na Espanha. "Se todo animal
inspira ternura, o que houve, então,
com os homens?", perguntam Guimarães Rosa e César Danilo.
Os ataques do Hamas a Israel e a
resposta violentíssima e desproporcionada de Israel permitem deduzir que os homens (e a mulheres)
daquela parte do mundo não inspiram a menor ternura uns aos outros. "O que houve com os homens
[sejam judeus, sejam palestinos]?"
(há várias outras parte do mundo
em que a pergunta cabe igualmente, mas o espaço é pouco).
Faço coberturas esporádicas em
Israel e nos territórios palestinos, a
cada tanto. Uma só vez, em 1987,
antes da primeira intifada, havia o
que, para os parâmetros locais, se
poderia chamar de paz.
Depois, foi ficando crescentemente inviável tentar encontrar
um mínimo de racionalidade de
parte a parte, porque ambos os lados pensam com o fígado e com os
respectivos livros sagrados à mão
(nada contra religiões, mas, definitivamente, não dá para repartir um
território com base na Torá ou no
Corão ou na Bíblia).
Na última vez, em 2002, Israel
havia invadido os territórios palestinos e sitiado, entre outras cidades,
a Belém em que, segundo a tradição
cristã, nasceu Jesus. O administrador do hospital local contou que encontrara 28 cadáveres de pessoas
mortas pelos israelenses. Os corpos
haviam sido enterrados no jardim,
porque as tropas ocupantes não
permitiam a entrada de ambulâncias que os retirassem.
Em outro momento, houve um
atentado no Mahane Yehuda, popular mercado de Jerusalém. Vi pedaços de massa encefálica misturados a tomates esmagados.
Nessas circunstâncias, os homens (e as mulheres) naquela região não podem mesmo sentir ternura. Apenas reproduzem o horror
que leva a mais horror e a menos
ternura.
crossi@uol.com.br
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