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Educação literária
Ler também pode ser muito perigoso, como deve saber qualquer
adolescente que tenha prestado
vestibular. Se ao final do ensino
médio o estudante ainda não domina o mínimo do cânone literário, corre sério risco de não conseguir entrar na faculdade desejada.
Para maximizar as chances dos
alunos nos processos seletivos, os
colégios adaptam seus programas
à lista de autores consagrados, cujas obras são impostas aos discentes da forma aparentemente mais
lógica -ou melhor, cronológica.
O resultado é que um jovem recém-egresso do primeiro grau pode se defrontar, sem maior preparo, com Camões. Isso não deixa de
ser um início grandioso, mas é
também muito difícil para quem
está habituado às mensagens curtas do Twitter e das redes sociais.
A dificuldade, todavia, não é de
hoje. Graciliano Ramos revelou,
em "Infância", o quanto o aprendizado dos clássicos pode ser doloroso: "Foi por esse tempo que
me infligiram Camões, no manuscrito", lembra ele. "Aos sete anos,
no interior do Nordeste, ignorante
da minha língua, fui compelido a
adivinhar, em língua estranha,
as filhas do Mondego, a linda Inês,
as armas e os barões assinalados...
Deus me perdoe. Abominei
Camões".
É inegável que a escola não pode descartar o patrimônio cultural
do país, nem lhe cabe atribuir à
linguagem cotidiana um valor estético que esta não possui: sua tarefa consiste em conectar a realidade do aluno à memória da coletividade, para que ambas possam
se vivificar e se desenvolver.
O contato com a tradição literária só pode produzir resultados
consistentes se o estudante consegue divisar algum sentido nas
obras que lhe são apresentadas.
Se estas se resumem a uma carga
que tem de ser suportada até o
vestibular, e depois abandonada
com alívio, então o sistema educacional não atingiu seu objetivo.
Nenhum processo de aprendizagem pode alcançar êxito se não
se conectar com o presente, com a
existência dos indivíduos que precisam ser socializados. A tradição
e a norma culta não são o ponto de
partida, mas o ponto de chegada.
Como se discutiu em reportagem publicada ontem pela Folha,
não se trata de reduzir o ensino literário a uma fôrma que gira no
sentido horário ou no anti-horário, e sim de buscar nos livros do
passado e do presente elementos
que despertem o interesse dos jovens estudantes -e os tornem aptos a descobrir o prazer da leitura.
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