São Paulo, quinta-feira, 29 de janeiro de 2004

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TENDÊNCIAS/DEBATES

Uma terra de todos

WALTER FELDMAN

No dia 25 de janeiro , a cidade de São Paulo comemorou 450 anos de fundação. A se julgar pelos números disponíveis, ela foi e continua sendo a capital de todos os brasileiros, em especial dos nossos amigos mineiros e nordestinos. O que, por si só, põe por terra um argumento surrado que voltou a ser brandido por ocasião dos debates da reforma tributária -o de que os paulistas, em geral, e os paulistanos, em particular, não são nem um pouco solidários com os cidadãos que nasceram em outras regiões do país. Nada mais falso, como se verá a seguir.


Não se tem notícia de alguém que, sinceramente, seja capaz de defender a tese de que a guerra fiscal é positiva


Se mais não fosse, não se tem notícia de alguém que, sinceramente, seja capaz de defender a tese de que a guerra fiscal promovida por Estados e municípios é positiva para o desenvolvimento do país e que subtrair recursos de São Paulo contribui para amenizar a miséria e as diferenças sociais. Por acaso, para dar apenas um exemplo, um baiano que vive no bairro de Itaquera vale menos que um baiano que mora nas franjas do Pelourinho ou vice-versa? Afinal, não somos todos cidadãos dessa imensa "casa" chamada Brasil?
Levantamento divulgado pela Fundação Seade, a partir de dados do IBGE, revela que, em 2000, São Paulo tinha 37 milhões de habitantes. Cerca de 25% dos que ali moravam -algo em torno de 9 milhões de pessoas- provinham de diversos Estados brasileiros e de outros países. Entre 1995 e 2000, cerca de 1,2 milhão de pessoas migraram para o Estado. Chama a atenção o fato de que, naquele período, 720 mil cidadãos se instalaram na região metropolitana de São Paulo, 410 mil dos quais apenas na capital.
As razões que levam as pessoas a deixarem sua terra natal, ainda que no último pau-de-arara, são amplamente conhecidas: a busca de melhores oportunidades econômicas e o sonho de um futuro melhor para si e para seus filhos. Dados compilados pela Fundação Seade confirmam o que intuitivamente todos nós sabíamos: 78% dos migrantes tinham idade entre 15 e 59 anos (faixa em que se concentra a maior parte dos que compõem a população economicamente ativa) e mais de 60% deles eram solteiros. Ou seja: trata-se de uma gente que cai na vida em busca de oportunidades.
Se compararmos o fluxo migratório no período 1986-1991 com o de 1995-2000, constataremos que, nessa última etapa, cerca de 200 mil pessoas a menos rumaram para São Paulo. Em contrapartida, o número de pessoas que viviam no Estado e saíram para outros cantos pulou de 648 mil para 884 mil. O fato de a quantidade de migrantes ter diminuído não significa que o fluxo de nordestinos tenha seguido o mesmo rumo. A rigor, ele se manteve estável, em torno de 720 mil pessoas. O que cresceu foi sua participação percentual, que saltou de 51,7% para 57,7%.
Na verdade, não é apenas a região metropolitana de São Paulo -a maior do país, onde viviam, em 2000, 17,8 milhões de pessoas, 48% da população do Estado- que continua sendo um grande pólo de atração de migrantes. O mesmo ocorre, em menor proporção, com as demais 25 regiões metropolitanas do país, conforme estudo elaborado pela Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano S.A. (Emplasa). De 1996 a 2000, todas elas, sem exceção, registraram um crescimento populacional superior ao verificado em seus respectivos Estados. Por óbvias, nos sentimos dispensados de enumerar as razões desse processo.
O problema, porém, não se resume à densidade demográfica. Hoje, é impossível pensar soluções para os grandes aglomerados urbanos sem levar em conta a necessidade de se ter mecanismos legais que levem ao planejamento integrado das cidades e à criação de um fundo de fomento aos investimentos em infra-estrutura. Esse é mais um dos grandes desafios que estão colocados ao Congresso. Foi por essa razão que a Câmara promoveu, em novembro, audiências públicas a fim de recolher subsídios que lhe permitam elaborar um "Estatuto das Metrópoles". Afinal, nelas vivem cerca de 40% da população brasileira.
A elaboração, aprovação e implementação do "Estatuto das Metrópoles" será um presente para São Paulo, mas também para todas as regiões metropolitanas do país e, em especial, para os paulistas, baianos, cearenses, mineiros, paranaenses e para todos os que, independentemente de sua origem, nelas vivem. O que não significa dizer que devamos descuidar das demais regiões do país. Afinal, como se sabe, uma coisa é uma coisa...

Walter Feldman, 50, médico, é deputado federal (SP), vice-líder do PSDB e presidente da Subcomissão de Ordenamento Territorial e Regiões Metropolitanas da Câmara dos Deputados.


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