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TENDÊNCIAS/DEBATES
A numeração de obras autorais deve ser implementada?
SIM
Que venha a numeração
JOSÉ CARLOS COSTA NETTO
O projeto de lei 4.540-A, de 2001,
de autoria da deputada Tânia Soares (PC do B-SE), aprovado pelo Congresso Nacional e que aguarda a sanção
do presidente da República, acrescenta
artigo (28-A) ao capítulo II (dos Direitos Patrimoniais do Autor e de sua Duração) do título III da lei 9.610, de 1998,
que regula os direitos autorais no país.
Estabelece, sinteticamente, o dispositivo legal que "os exemplares postos à
venda da obra artística, científica ou literária deverão conter numeração ordinal crescente e a assinatura do autor". O
prazo para sua entrada em vigor é de
120 dias contados de sua promulgação.
A matéria não é nova. A obrigatoriedade de numeração de exemplares vigorou durante 25 anos para as obras literárias, considerando-se "contrafação"
qualquer repetição de número, exemplar não numerado ou número que excedesse à edição contratada. Era o artigo
63 e seu parágrafo único da lei 5.988, de
1973, revogado pela lei 9.610, de 1998,
atualmente vigente.
Embora constasse do projeto que resultou na lei de 1973 a obrigatoriedade
da numeração dos exemplares que reproduzissem fonogramas (discos e fitas) -o artigo 83, baseado na emenda
229, do senador Franco Montoro-, foi
o dispositivo vetado. Foi, aliás, o único
dispositivo legal -de uma lei de 134 artigos, aprovada pelo Congresso Nacional- que recebeu o veto do Executivo.
A discussão é antiga, portanto, e se renova, com maior ênfase, nos últimos
dias.
Recebendo a adesão de parcela atuante e altamente expressiva da classe artística musical, como Lobão, Beth Carvalho e Rita Lee, entre outros, o novo texto
legal encontra resistência das editoras
literárias e, ainda com mais eloquência,
das companhias fonográficas (gravadoras). Com quem está a razão?
Não se podem negar algumas impropriedades: tanto do destempero acusatório da exposição de motivos, que coloca a prática de "fraudes" como rotina
e afirma que é "exceção, e não regra" a
existência de empresas idôneas nesse
mercado, quanto em relação ao conteúdo do próprio texto legal, especialmente
em exigir a "assinatura do autor" em cada exemplar de "obra artística, científica ou literária" posta à venda -o que é
mais apropriado para obras originais
ou para pequenas tiragens artesanais,
muitas vezes confeccionadas pelo próprio autor, como é o caso das litogravuras.
Fora desse contexto, a assinatura (ou,
muitas vezes, as assinaturas de todos os
titulares de direitos autorais envolvidos) em cada exemplar de livro, CD,
DVD etc. é, nitidamente, inviável.
Indiscutível, também, que a regra de
numeração de exemplares não pode ser
aplicada sem sensibilidade às peculiaridades de cada processo industrial e comercial que envolvem a extensa diversidade de obras intelectuais (artísticas,
científicas ou literárias) abrangida pelo
dispositivo em questão. Cabe, aqui, a
necessária regulamentação dessa lei,
com todo o detalhamento indispensável
à perfeita adequação a cada área envolvida.
A numeração deverá, também, estar
em harmonia com o direito de fiscalização que a lei vigente já confere ao autor
em relação ao aproveitamento econômico de sua obra (parágrafo 2º do artigo
29, artigos 59 e 100) e selos e sinais de
identificação de exemplares de fonogramas, livros e obras audiovisuais (artigo
113).
Aparando-se todas as arestas, trata-se,
a adoção de um sistema eficaz de numeração de exemplares de obras intelectuais, de conquista dos autores e artistas
brasileiros que não pode ser desprestigiada no acidentado percurso da defesa
de seus direitos autorais.
Desta forma, a sociedade estará fortalecendo diretamente a célula embrionária de toda a atividade cultural: o criador
intelectual.
José Carlos Costa Netto, 48, é advogado especializado em direito autoral, compositor e produtor cultural.
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