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CARLOS HEITOR CONY
Ou César ou nada
RIO DE JANEIRO - Devia citar a frase em latim, "aut Caesar, aut nihil",
mas vai mesmo em vernáculo -já me acusam de apelar muito para o
latim mal aprendido mas não esquecido. Foi um lema que serviu até para
Hitler em seus raros momentos de indecisão, e o resultado todos sabemos.
Seria bem melhor se ele tivesse escolhido o nada.
Outro que disse coisa parecida, de
forma mais suave porque era latino,
mas com significado igual, foi Mussolini, sócio de Hitler na mesma aventura: "Prefiro um dia de leão a cem
anos de ovelha".
Esse tipo de radicalismo muitas vezes transcende a política e a economia e invade as artes em geral. Lembro um grupo de poetas patrícios que,
ali pelos anos 40 ou 50, adotou o lema: "Ou Dante ou nada". Do grupo,
fazia parte o Gerardo Mello Mourão,
que hoje se penitencia daquele arroubo, apesar de ter sido, naquela geração, o que mais se aproximou de
Dante.
César e Dante podem ser considerados leões na selva das selvas que é a
vida em geral. O Joel Silveira me garantiu que leão nunca é de nada, só
tem a goela, o rugido que faz tremer a
floresta e impõe terror aos súditos,
que são os outros animais, desde o tigre e o elefante, aos esquilos e às borboletas (não tenho certeza se há borboleta nas florestas, mas, de qualquer
forma, elas também devem ficar assustadas com o formidável rugido
que sai da goela do leão).
Não sei por que estou pensando em
César, Dante, Mussolini, Hitler, Joel
Silveira, Gerardo Mourão e borboletas. Não, não é falta de assunto, pelo
contrário, é assunto demais.
Outro dia, vi um ministro do atual
governo, sobre o qual há suspeitas de
nada ter feito durante o ano que passou, garantir que, no próximo ano,
fará a floresta tremer com o rugido
que sairá de sua goela colossal. Nada
fez até agora porque não era tempo.
Preferiu ser um nada em 2003 para
ser um César em 2004.
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