São Paulo, quarta-feira, 30 de janeiro de 2002

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ANTONIO DELFIM NETTO

A fácil CPMF

Não é fácil entender o que a área econômica pretende fazer com a imagem de FHC. Desde que a correção da tabela do Imposto de Renda foi aprovada no Congresso (com o apoio da liderança do governo), tem sido estimulado um debate kafkaniano, que terminou com o veto do sr. presidente. Foi emitida, como compensação, uma medida provisória que aumenta os impostos sobre as empresas de serviço. Houve uma reação indignada da Câmara e do Senado e das vítimas do novo avanço tributário. Rapidamente, os gênios orçamentários utilizaram os "rumores" (no que são mestres) para informar que nova MP substituirá a proposta original por um novo aumento da CPMF ou do IOF.
Afinal, qual é o problema? Por que é preciso, como insistem, aumentar os impostos em lugar de simplesmente cortar o aumento das despesas? O artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal diz que "a concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorre renúncia de receita deverá (...) estar acompanhada de medida de compensação (...) por meio da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição". O governo insiste que houve "renúncia de receita" e ignora o resto. Malandramente, aliás, confunde-se, no IR, isenção com dedução, e esquece-se o artigo 12 da Lei de Responsabilidade Fiscal.
É preciso muito cinismo para considerar que não corrigir a tabela do Imposto de Renda durante seis anos consecutivos foi um "incentivo ou benefício" para o contribuinte. Pior ainda é afirmar que, não podendo mais extorqui-lo ilegalmente (porque se tratava de cobrar mais imposto do que a lei alguma vez autorizou), o que deixa de agafanhar no golpe ousado é "renúncia de receita"!
A CPMF foi criada pelo respeito do Congresso a um cientista e grande administrador -que é o ex-ministro Adib Jatene- para resolver o insolúvel problema da saúde. Ele cedo descobriu que a saúde iria tardar a beneficiar-se dos recursos: o Ministério da Fazenda cobrou, primeiro, "empréstimos" que lhe havia feito anteriormente! É por isso que hoje o dr. Jatene se diverte dizendo que só voltará ao governo como ministro da Fazenda...
A CPMF é um péssimo imposto, porque produz distúrbios sobre os preços relativos e, consequentemente, reduz a eficiência do sistema econômico. E é tanto mais maléfica quanto maior a sua alíquota, que, hoje, já está em 0,38% -para financiar a Previdência Social, a saúde e o combate à pobreza. Fala-se agora em aumentá-la para compensar a "renúncia de receita irresponsavelmente imposta" pelo Congresso. Se for aumento no IOF será pior, pois aumentaria diretamente o custo do capital!
A CPMF transformou-se no "imposto dos desesperados". O ex-ministro Cavallo elevou-o na Argentina, às vésperas do colapso, para 0,6%. O ridículo boina vermelha Hugo Chávez acaba de instituí-lo com a mesma alíquota de 0,6% para compensar "a queda de receita proveniente da redução dos preços do petróleo".
Ele é o óleo de cobra do Velho Oeste: cura desde unha encravada até câncer. É o imposto preferido dos governos que têm pouco apreço pela produtividade e têm um viés contra o desenvolvimento econômico.


Antonio Delfim Netto escreve às quartas-feiras nesta coluna.
E-mail: dep.delfimnetto@camara.gov.br


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