São Paulo, domingo, 30 de maio de 2004

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CLAUDIA ANTUNES

Razões de Estado

RIO DE JANEIRO - Entre os ícones americanos que os acontecimentos dos últimos anos puseram em questão está o da objetividade e da imparcialidade de sua imprensa. O 11 de Setembro foi um marco, mas a corrosão da credibilidade começou antes, na eleição de Bush, quando a opção final foi pôr panos quentes nas fraudes provavelmente decisivas para a vitória dos republicanos.
Os arranhões na mitologia não se devem à excêntrica Fox, de Rupert Murdoch, que nunca escondeu torcer por Bush e suas políticas, mas ao comportamento de veículos tradicionais, como o "New York Times" e o "Washington Post". Mesmo na semana passada, quando fez um mea-culpa das notícias publicadas sobre armas de destruição em massa no Iraque, o "NYT" usou pesos e medidas diferentes em relação a outra autocrítica recente, no caso Jayson Blair.
No episódio Blair, o jornal foi específico sobre os erros e duro com o repórter. Agora, numa questão com conseqüências muito mais graves (tratava-se da justificativa para uma guerra), optou por uma retratação mais fluida. Pior do que isso: ao reconhecer ter confiado demais em fontes da oposição a Saddam Hussein, o "Times" sugeriu que autoridades do governo também tenham sido enganadas por elas.
O que isso significa é que, a despeito da pluralidade e da liberdade de expressão próprias a um país democrático, para o quarto Poder nos EUA, o limite da imparcialidade são as chamadas razões de Estado.
Antes do ataque às torres gêmeas ou da invasão do Iraque, essa já era a regra nas reportagens sobre outros países. Para ficar em exemplos mais evidentes, o venezuelano Hugo Chávez nunca esteve separado de adjetivos como "populista" ou "esquerdista", o conflito entre Israel e os palestinos sempre teve cobertura pouco objetiva e o velho programa nuclear brasileiro passou, recentemente, a ser enquadrado nas mesmas suspeitas dirigidas a países considerados "párias" pela Casa Branca.


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