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TENDÊNCIAS/DEBATES
Deve-se criar um Ministério do Ensino Superior?
SIM
É preciso voltar a discutir o ensino superior
JOSÉ ANTÔNIO ALEIXO DA SILVA
Quando Fernando Henrique Cardoso assumiu a Presidência, mesmo correntes contrárias à sua eleição
vislumbraram um novo tratamento ao
ensino superior por ele ser um ex-professor universitário. Mas logo os conflitos se mostraram inevitáveis e, ao final
de seu mandato, a situação do ensino
superior é lamentável. Enquanto isso,
houve a proliferação de instituições privadas, pondo o quantitativo como prioridade e deixando a qualidade em segundo plano.
Em 1994, as instituições privadas de
ensino superior correspondiam a 74%
das existentes no país e, em 2000, eram
85%, com o número de matrículas crescendo 121%, enquanto no ensino público o crescimento foi de 36%. Hoje, o
Brasil tem 7,7% dos jovens entre 18 e 24
anos no ensino superior, sendo um terço em instituições públicas e dois terços
em instituições privadas, o que confere
ao país uma das maiores taxas de privatização do ensino superior no mundo.
Foi instituído o Provão (Exame Nacional de Cursos) para avaliar o ensino de
graduação, mas não houve uma política
de apoio aos cursos deficientes. Ao que
parece, o Ministério da Educação apostou em criar um instrumento que qualificasse o ensino privado em vez de investir na expansão do ensino público,
mesmo que este tenha apresentado melhores resultados.
A exclusão ao ensino público cresce
de forma exponencial. Em 2002, a oferta
de vagas nas instituições públicas foi de
cerca de 245 mil para 5,1 milhões de
candidatos. Se o crescimento continuar
obedecendo aos padrões atuais, em
2009 teremos 400 mil vagas para 15,2
milhões de candidatos. Isso torna a educação um excelente mercado, auferindo
lucros exorbitantes aos investidores.
Prova disso é a atual tentativa da Organização Mundial do Comércio de globalizar o ensino, sendo o Brasil um mercado altamente promissor.
No que diz respeito aos investimentos
no ensino superior, dados recentes
mostram que houve uma redução na
ordem de 33%, caindo de 0,91% para
0,61% do PIB. Greves, sucateamento de
laboratórios, imposição ministerial nas
nomeações de reitores caracterizam a
passagem de Paulo Renato pelo MEC.
Parte das poucas verbas que chegaram às universidades veio do Ministério
da Ciência e Tecnologia, através de projetos especiais, entre eles os fundos setoriais, talvez inspirados nos "fundos vinculados" adotados no final da era Thatcher no Reino Unido. Mesmo o CNPq,
principal órgão do MCT ligado às universidades, recebeu severos cortes orçamentários.
Pela primeira vez nos últimos 30 anos,
houve uma redução de cerca de 12% na
produção científica do Brasil, e as desigualdades regionais são significativas.
Nos EUA, nenhuma universidade produz mais de 1,5% do total de publicações. No Brasil, a USP produz 25%.
Resultante do descaso governamental
para com o ensino superior, voltou à
discussão sua separação do ensino básico, mesmo não constando do programa
oficial do governo recém-eleito. Discute-se criar um Ministério do Ensino Superior -uma idéia do senador eleito
Cristovam Buarque (PT-DF)- ou
transferir as Ifes (Instituições Federais
de Ensino Superior) para o MCT.
Cristovam fundamenta sua idéia dizendo que países como França, Cuba e
Rússia têm ministérios para o ensino
superior. Questiona o fato de a área econômica possuir cinco ministros e a Cultura e o Esporte, ministérios específicos.
Afirma ainda que é inadmissível que
um ministro que deseje dar atenção às
universidades tenha que, de certa forma, desviar a atenção do ensino básico.
No atual sistema educacional brasileiro, o ensino infantil é de responsabilidade dos municípios; o ensino fundamental, do município e do Estado; e o ensino
médio, do Estado. Já o ensino superior
público é de responsabilidade da União.
Portanto, mesmo considerando as dificuldades orçamentárias, é louvável a
idéia de Cristovam, pois pode resultar
em melhorias do sistema educacional
do país.
Argumentos contrários existem, principalmente concernentes à transferência do ensino superior para o MCT. As
ciências humanas, teoricamente, seriam prejudicadas por lidar com assuntos que, necessariamente, não geram
novas tecnologias ou produtos de mercado. Outros defendem que o sistema
básico e o superior devem continuar associados, já que o profissional da educação básica é formado na universidade.
O importante é que, após um longo
período em que o ensino superior só era
lembrado em épocas de greves, ele volta
a ser discutido. Na proposta do PT para
o ensino superior, os dois primeiros
compromissos são: a) promoção da autonomia universitária e da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão
nos termos da Constituição (artigo
207); b) reconhecimento do papel estratégico das universidades, em especial as
do setor público, para o desenvolvimento econômico e social do país.
Portanto não importa onde o ensino
superior seja alocado, o fundamental é o
reconhecimento de sua importância e o
tratamento adequado pelo novo governo, que deve dar direitos e cobrar deveres.
José Antônio Aleixo da Silva, 51, professor da
Universidade Federal Rural de Pernambuco, é secretário regional da SBPC/PE
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