São Paulo, quinta-feira, 30 de dezembro de 2010 |
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TENDÊNCIAS/DEBATES Tropas brasileiras deveriam deixar o Haiti MARK WEISBROT
A declaração da presidente eleita Dilma Rousseff, neste mês, de que fará o Brasil se opor às violações dos direitos humanos no Irã foi recebida aqui em Washington com certa animação. É evidente que o Departamento de Estado não enxerga essas coisas sob uma perspectiva humanitária, mas utiliza os direitos humanos como arma política para promover o ódio contra os alvos de sua preferência. Mesmo assim, a politização dos direitos humanos por parte de Washington não é motivo para um país como o Brasil se abster de defender os direitos humanos em todo o mundo, de maneira movida por princípios, e não política. Mas também o Brasil deveria começar pelo lugar em que exerce a maior influência; no momento, esse lugar é o Haiti, onde o Brasil chefia a missão militar da ONU (a Minustah) que ocupa o Haiti. Essa missão teve legitimidade questionável desde o início, quando foi enviada ao Haiti depois de o governo democraticamente eleito do presidente Jean-Bertrand Aristide ter sido derrubado em um golpe de Estado em 2004. O golpe foi resultado direto dos esforços dos EUA para derrubar o governo de Aristide. Membros do governo constitucional foram postos na prisão e milhares dos partidários do governo foram mortos. A Minustah desenvolveu uma reputação de brutalidade e violações dos direitos humanos, que incluem a invasão de um dos maiores bairros pobres do Haiti, em julho de 2005, deixando dezenas de civis mortos ou feridos. Neste mês, o Haiti promoveu eleições presidenciais, financiadas pelos Estados Unidos, das quais o maior partido político foi excluído. Foi o equivalente a promover uma eleição no Brasil sem permitir a participação do PT ou do PSDB. As eleições também foram maculadas por fraudes e pela ampla exclusão de eleitores. Basicamente, a Minustah veio tomar o lugar, como força repressora, do odiado Exército haitiano, que o presidente Aristide aboliu. Washington não permite que haja democracia no Haiti, porque os haitianos inevitavelmente escolheriam um governo de esquerda. Telegramas divulgados recentemente pelo WikiLeaks ilustram que o objetivo de Washington é manter o controle sobre o governo do Haiti e, especialmente, sobre suas relações exteriores. Por que o Brasil deveria participar da negação de direitos humanos e democráticos básicos do Haiti? E, para agravar a situação ainda mais, a Minustah provocou uma epidemia de cólera que já matou 2.400 pessoas e contaminou mais de 109 mil, provavelmente devido à negligência criminosa e grosseira de despejar dejetos humanos no rio Artibonite. Milhares de haitianos foram às ruas para exigir que as tropas da Minustah deixem o país. A Minustah custa mais de US$ 500 milhões por ano, sendo que a ONU não consegue levantar nem um terço desse valor para combater a epidemia que a própria missão causou. E agora ainda pede aumento dos recursos para a Minustah, para além de US$ 850 milhões. Organizações e líderes políticos progressistas, incluindo a maior confederação sindical -a CUT-, o MST e líderes políticos do PT, como Markus Sokol, pediram que o Brasil retire suas tropas do Haiti. Dilma deveria dar ouvidos à sua base e à população do Haiti, que não pediu esse exército de ocupação, que não tem razão legítima para estar lá. Como afirmou a CUT, o Brasil deveria "enviar médicos e engenheiros, não tropas de ocupação". Tradução de CLARA ALLAIN
MARK WEISBROT é codiretor do Centro de
Pesquisas Econômicas e Políticas ( www.cepr.net ),
em Washington, e presidente da Just Foreign Policy
( www.justforeignpolicy.org ). Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo. debates@uol.com.br Texto Anterior: Kenneth Maxwell: Começos Próximo Texto: Roberto Teixeira da Costa: Alavancando o crescimento Índice | Comunicar Erros |
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