São Paulo, sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

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Avanço chinês

Presença industrial da China nas importações cresce e evidencia a ameaça de a indústria brasileira ficar para trás em áreas importantes

A área de pesquisas econômicas do BNDES divulgou nesta semana um interessante estudo sobre o aumento da participação de produtos da China no mercado brasileiro. O trabalho mostra que as dificuldades da indústria nacional não serão passageiras frente à voracidade das empresas chinesas, favorecidas por capital abundante e câmbio competitivo.
Em 2005, a China respondia por mais de 10% das importações brasileiras em apenas 6 de 19 setores industriais; já nos doze meses encerrados em agosto de 2010, isso ocorria em 12 setores. Nesse período, US$ 21,4 bilhões foram importados dos chineses, valor que representa 14,5% das compras brasileiras -contra 7,3% em 2005.
O salto é mais pronunciado em produtos com forte componente de trabalho e de tecnologia. É justamente nas frentes em que o Brasil é menos competitivo que a perda de mercado foi maior. São setores em que o país tem participação inferior a 1% nas exportações mundiais, como máquinas e equipamentos, material elétrico, eletrônicos, química etc.
A transformação da China em grande plataforma industrial do mundo modifica profundamente a divisão internacional do trabalho. De um lado estão os países desenvolvidos, que fornecem tecnologia em troca de acesso ao mercado chinês, mas que agora se veem ameaçados por novos concorrentes em seus setores líderes (aviação, biomédica, nanotecnologia, química etc.). De outro, os fornecedores de matérias primas, a maior parte em estágio intermediário de desenvolvimento, beneficiados pelo alto preço de suas exportações agrícolas e minerais, mas com problemas para conter o avanço de produtos chineses.
O Brasil é muito competitivo em setores primários, que contam com o apoio de tecnologia e pesquisa aplicada (a Embrapa é o exemplo de sempre na agropecuária), mas tem dificuldades de competir nas indústrias intensivas em capital e conhecimento fora do complexo de commodities.
Para ser rentável economicamente, a indústria avançada demanda grande volume de capital e produção em larga escala. Como o mercado interno (mesmo o chinês) dificilmente tem tamanho suficiente em setores de ponta, torna-se crucial contar com exportações, ao menos nos estágios iniciais. Este tem sido o aspecto forte da estratégia chinesa, que além da política cambial privilegia a geração de tecnologia própria.
Argumentam alguns que não faz sentido falar em desindustrialização com a economia brasileira atuando a plena capacidade. É verdade, mas numa visão de curto prazo. Sem uma política industrial eficaz, auxiliada por pesquisa aplicada, câmbio realista e infraestrutura moderna, o Brasil continuará correndo o grave risco de perder densidade industrial nos próximos anos.


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