São Paulo, quinta-feira, 04 de novembro de 2010

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Mínimo pode ir a R$ 600 no final de 2011

Futura presidente diz também que é pessoalmente contra a volta da CPMF, ideia que havia sido defendida por Lula

Dilma descansa na Bahia até sábado; presidente faz hoje a última reunião ministerial do governo

DE BRASÍLIA

A futura presidente Dilma Rousseff discordou ontem do presidente Lula minutos depois de ele defender a volta da CPMF, o extinto imposto do cheque. Enquanto Lula pregou a necessidade do tributo, Dilma disse ser pessoalmente contrária a ideia.
Dilma mostrou contrariedade em relação ao assunto minutos depois de o presidente deixar a entrevista. Nos primeiros 30 minutos, em que Lula falou, ficaram lado a lado. Quando ela começou a responder aos jornalistas, ele seguiu para seu gabinete.
Dilma também sinalizou que vai mudar a fórmula de reajuste do salário mínimo para 2011, como antecipado ontem pela Folha.
Lula chamou de "temeridade" as especulações de que a presidente eleita estaria apenas guardando seu lugar para que ele volte em 2014. "Rei morto, rei posto."
O presidente afirmou que não está interferindo na composição do novo governo e disse que a nova administração tem de ter "a cara" de Dilma. A presidente eleita desconversou sobre seu primeiro-escalão. Afirmou que não tem nomes e fez um afago ao vice, Michel Temer, e ao PMDB, negando qualquer problema na relação.
Lula pediu que a oposição não faça a "política do estômago" tratando Dilma com raiva e a aconselhou a esquecer problemas eleitorais para governar bem.
Hoje, Lula faz a última reunião ministerial de seu governo. Dilma descansa até sábado em uma praia da Bahia. Depois, visitará a família em Porto Alegre.

CPMF
Demonstrando ainda não ter digerido uma das maiores derrotas de seu governo, o presidente Lula defendeu o retorno da CPMF para garantir investimentos na saúde. Lula voltou a criticar o Congresso pela extinção do imposto e alfinetou os parlamentares.
"Todos os deputados e senadores têm um plano médico que eles pagam, portanto no hospital ele faz 500 exames naquelas máquinas sofisticadas. Se a gente quiser levar isso para a sociedade, nós vamos ter que ter mais recurso."
Para Dilma, é preocupante a criação de um novo tributo, mas ela disse estar aberta à discussão por causa dos cofres dos Estados. "Eu tenho muita preocupação com a criação de imposto, preferia que a gente tivesse outros mecanismos. Mas tenho visto uma movimentação dos governadores nessa direção, não posso fingir que não vi".
Falou ainda que não pretende "enviar ao Congresso a recomposição da CPMF. Do ponto de vista do governo federal, não há necessidade premente. Do ponto de vista dos governadores, eu sei que há este processo", afirmou.

BOLSA-FAMÍLIA
A futura presidente assegurou que o benefício terá reajuste e prometeu cadastrar 100% da população que necessita da assistência. "Eu não sei hoje dizer qual é esse reajuste, mas que terá reajuste eu asseguro que terá."

SALÁRIO MÍNIMO
Dilma deverá mudar a fórmula de reajuste do salário mínimo adotada no segundo mandato do governo Lula, garantindo um ganho maior do que previsto pela regra atual. Afirmou ontem que pretende fazer uma "compensação" para evitar o que, pelo atual sistema, aconteceria no ano que vem: o mínimo não teria reajuste real, sendo corrigido apenas pela inflação.
Dilma anunciou que estuda antecipar o aumento do mínimo em 2011 e diminuir o percentual previsto para 2012. Com isso, o valor do benefício pode chegar, segundo ela, a R$ 600 no fim de 2011.
"Estamos avaliando se é possível fazer essa compensação", disse. Antes de Dilma projetar o mínimo em R$ 600 no fim de 2011, Lula criticou a promessa feita pelo candidato derrotado José Serra (PSDB), que ao longo da campanha se comprometeu adotar esse reajuste no começo do próximo ano. "Precisam aprender que o povo não é massa de manobra. Tem gente que ainda trata o povo como se fosse boiada."

2014
"Rei morto, rei posto", resumiu Lula quando questionado sobre sua interferência no governo Dilma e sobre possível volta em 2014. Segundo Lula, o seu retorno, devido à alta popularidade com que deixa o cargo, criaria muita expectativa e pressão.
"Acho que quem vai sair do governo tem a responsabilidade de pensar, contar até um milhão, em voltar algum dia, porque chegar ao final do mandato com o reconhecimento popular que tem o governo, voltar é uma temeridade, porque a expectativa gerada é infinitamente maior". Dilma não se manifestou sobre o assunto.
Lula mencionou um fato que ocorreu com José Serra, que durante a campanha foi atingido por uma bolinha de papel e por uma bobina de fita adesiva. "É muito pequeno, neste momento, estar discutindo 2014. A gente deveria estar discutindo 2011. Em 2014 a gente deveria discutir a Copa do Mundo e em 2016, discutir a Olimpíada, e deixar para discutir eleições um pouco mais para a frente, porque senão vai ter uma enxurrada de bolinha de papel batendo na nossa cabeça até 2014 e não queremos isso."

CONGRESSO
O presidente disse que o Congresso é a cara da sociedade e que Dilma terá que se relacionar com os que foram eleitos e não com os que ela gostaria que fossem eleitos. "Ela vai ter que conversar com o companheiro do PCdoB e vai ter que conversar com o Tiririca. Essa é a lógica do jogo. Você tem um cidadão que é eleito com 10 milhões de votos e outro que é eleito com 1 milhão de votos. Quando eles chegam aqui cada um vale um voto, não tem melhor ou pior. Ela não pode criar novos partidos e criar novos senadores. São os que estão aí, e todos têm direito a um voto."

GOVERNO DILMA
A presidente eleita disse que ainda não tem nomes para seu governo, mas que só indicará pessoas com qualidades técnicas, sem problemas éticos e que tenham aval político dos aliados. "Esse é um governo que vai se pautar não por uma partilha, mas por um processo de construção de uma equipe una. [...] Eu não considero que está maduro o processo de discussão dos nomes que integrarão os ministérios do primeiro escalão da alta administração do país."
Apesar de Lula estar se movimentando nos bastidores, oficialmente, garantiu que não está pedindo nada a sucessora. "O governo da Dilma tem que ser a cara e a semelhança da Dilma", disse.

OPOSIÇÃO
Lula pediu que a oposição dê um tratamento melhor a Dilma do que deu a ele nos oito anos de governo. "Contra mim não tem problema, podem continuar raivosos, do jeito que sempre foram. Mas, a partir de 1º de janeiro, que eles olhassem um pouco mais o Brasil, que eles torcessem para que o Brasil desse certo."

PMDB
Disposta a estancar eventuais desgastes com o PMDB, partido de Temer, Dilma fez elogios a sua atuação e negou que a sigla tenha um grande apetite por cargos. "O PMDB nunca chegou para mim pedindo cargo. Estão participando do processo de transição como participaram de todo processo eleitoral, sem conflito", afirmou a petista.

STF
Lula afirmou que já definiu o novo ministro do Supremo Tribunal Federal. Mas não revelou o nome porque quer o aval de Dilma. Disse que ela tem poder de veto. O nome mais cotado é de Cesar Asfor Rocha, do STJ.

VITÓRIA DE DILMA
"O que algumas pessoas viam como defeito na Dilma eu via como virtude, o fato de ela muito jovem ter resolvido ter coragem de brigar para garantir a democracia neste país. Acho que a chegada da Dilma ao poder é a vitória daqueles que perderam em 1968 e que muitos estavam desacreditados e a Dilma provou que no jogo democrático é possível chegar ao poder", disse Lula sobre sua pupila.

CONSELHOS
O presidente aconselhou Dilma a não governar com raiva. "É como se um jogador de futebol tomasse uma cotovelada e só ficasse pensando naquela cotovelada e em se vingar. Na cabeça de um presidente não tem que ter o pensamento da vingança, da raiva, do ódio", disse Lula, que foi interrompido discretamente por Dilma. "Não faz bem para a alma", disse a eleita.

MST
Dilma reforçou que não tratará o MST "como caso de polícia". Disse, no entanto, que não concorda que invadam prédios públicos e terras produtivas.
(SIMONE IGLESIAS e MÁRCIO FALCÃO)


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