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MINHA HISTÓRIA
KEIKO OTA
A dor nas urnas
(...)No 11º dia, o antissequestro
encontrou o Ives
já morto(...)
Mobilizamos o Brasil para
endurecer a lei do crime
hediondo
(...)Quero instituir a Semana
Nacional da Cultura de Paz
RESUMO
Em 1997, o
menino Ives Ota, então
com oito anos, foi sequestrado e assassinado
por policiais militares
que cuidavam da segurança das empresas da
família. Os pais de Ives,
Masataka e Iolanda Keiko Ota, criaram uma fundação com o nome do filho morto para ajudar
crianças carentes. No domingo, Keiko foi eleita
deputada federal pelo
PSB com 213.024 votos.
(...)Depoimento a
EVANDRO SPINELLI
DE SÃO PAULO
MARCELO MARANINCHI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Em 1997, a nossa família
estava só na prosperidade, o
trabalho estava indo muito
bem, tínhamos 14 lojas. Na
época, fomos pioneiros nas
lojas de R$ 1,99. Estávamos
no auge do trabalho.
Tudo aconteceu no dia 29
de agosto. Levaram o Ives. O
Ives reconheceu [os sequestradores], perguntou se eles
eram guardas do papai. Na
mesma noite, eles mataram o
Ives. Eram dois policiais militares e um civil. Enterraram
debaixo do berço e ainda vieram pedindo resgate e nos
dando ajuda.
Foram 11 dias de negociação, 11 dias de desespero, foi
um verdadeiro calvário para
nós. No 11º dia, o antissequestro pegou o pessoal e
encontrou o Ives já morto e
enterrado debaixo do berço.
Naquele momento de
ódio, mágoa, dor, sofrimento, iniciou-se o Movimento
da Paz e Justiça Ives Ota. Mobilizamos o Brasil todo para
mudar o Código Penal, endurecer a lei para crimes hediondos, quer era prisão perpétua com trabalho.
Ali, fomos recolhendo assinaturas, melhorando, começamos a juntar mais vítimas de violência, mães que
perdiam filhos. Eu fui aprender a parte espiritual, porque
não existe dor maior para um
pai, para uma mãe, do que
perder um filho. Não é fácil. E
aí começamos a desenvolver, a fundação foi crescendo, tomando outro rumo, e
começaram os trabalhos.
Nós criamos um trabalho,
que é "mães sábias na Terra,
filhos felizes no céu", com os
encontros das mães para ter
experiência, ter o relato de
outras mães, e muitas vinham pedir ajuda. Primeiro
a gente tirava o ódio, que caracteriza vingança.
O ódio não vai embora de
uma hora para outra. Fizemos um treinamento, a oração do perdão, para limpar o
subconsciente. O subconsciente entra sem a nossa ordem e fica lá, se manifestando. Enquanto você não treinar, ele se manifesta.
Muita gente fala: "dona
Keiko e seu Ota são dois iluminados: perdoaram os algozes do filho, e eu não consigo
nem perdoar minha mãe que
batia em mim". É porque nós
treinamos.
Muita gente acha que é divino, mas é porque a gente
não gosta de sofrer e queria
sair dessa situação. Então, fizemos o treinamento, mas isso demorou muito, um ano e
meio, dois, para superar.
A força do perdão gerou
um milagre na minha casa,
que é a vinda da Ises. Foi esse
o momento em que a gente
viu que tinha condição de ser
feliz e que Deus não estava
esquecendo a gente. E tocamos a vida para a frente, com
a força do perdão.
A gente tirou o ódio do coração para não manifestar
vingança. Mas por justiça, a
gente luta. Tem de existir a
justiça, senão o progresso do
Brasil fica atravancado. O
país está nessa situação porque não tem uma lei rígida.
Você vê os outros países.
Quando acontece uma atrocidade, matam uma criança,
mulher é espancada, todo
mundo se mobiliza para fazer justiça.
Quando a gente fez o movimento, as três milhões de assinaturas eram cobradas
constantemente. Esse é um
dos motivos para que eu vá lá
[ao Congresso] rever.
Eu achava que um parlamentar ia abraçar essa causa
ou pelo menos rever tudo isso, mas não aconteceu. Aí eu
falei: "Então eu vou". Porque
a gente era pressionado por
isso. Esse Código Penal está
ultrapassado e, no decorrer
do nosso trabalho, a gente vê
muita impunidade.
Eu sei que tem de haver
aquela articulação para que
as minhas propostas sejam
aprovadas. A gente tem de se
dar bem com todo mundo, fazer eles [os deputados] entenderem as minhas propostas. Eu estarei lá pra tentar fazer tudo isso, numa corrente
do bem pra mudar essas leis.
No Código Penal, a proposta é endurecer a lei para
crimes hediondos. No Brasil,
quem mata 15 [pessoas] está
sujeito a um teto de 30 anos
[de prisão]. E tem a progressão penal, que faz a pena cair
para dois quintos. Fazendo
essa continha, dá 12 anos.
Eu acho muito pouco para
quem é um psicopata, e nós
não podemos correr esse risco. Eu quero elevar o teto de
30 anos para cem. Fazendo a
continha, vai dar 40 anos.
Eu nunca fui para Brasília,
mas eu acho que tudo vai depender de mim, porque a
gente tem de ter um bom relacionamento. A gente não
vai lá para ser polêmico, porque quem sou eu para ficar
apontando erros? O meu intuito é unir. Não tenho medo.
No problema da violência,
existem muitas causas. Vou
apoiar também muitas coisas
boas que vão acontecer para
uma educação de qualidade,
em período integral, que eu
acho muito legal, curso técnico nas escolas públicas,
que é uma prevenção.
E também instituir o Dia
Nacional do Perdão. Porque
o perdão é uma questão de tirar o ódio do coração. Eu
acredito que todo ser humano é divino. O que camufla
são os sentimentos de ódio,
de rancor, de mágoa. Isso
que faz guerra, faz violência.
Aquela criança que viu
violência, assistiu a violência
dentro de casa, sofreu violência no ventre materno vai botar esse sentimento de ódio
que está gravado no subconsciente de uma forma violenta, se prostituindo, se drogando ou mesmo tirando a
vida do outro, inconsciente.
E também quero instituir a
Semana Nacional da Cultura
de Paz, em que a gente vai rever valores importantes, como amor ao próximo, valorização da vida e o perdão.
O Ministério Público condenou eles [os assassinos de
Ives Ota] a 43 anos e, na época, era de um sexto a progressão penal. Eles ficaram só
seis anos, estão soltos. Não
tenho medo deles. Eu mudei,
tudo em volta de mim mudou. Eu hoje ainda faço a oração do perdão. Fortalece a
gente no espírito. Perdoamos
a eles de coração, não temos
nenhum ressentimento. Mas
a justiça não foi feita, porque
eles não cumpriram 43 anos.
Nós, orientais, cultuamos
nossos ancestrais. A gente
acredita na reencarnação.
Existe uma vida pós-morte.
Por isso, nós cultuamos nossos ancestrais. A Ises é resultado dessa crença. A força do
perdão gerou um milagre.
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