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Incra dribla legislação para incorporar área de 6 cidades de SP
Superintendência usou poder exclusivo da presidência do órgão para retomar 904 mil hectares de terras no AM de 2006 a 2008
RUBENS VALENTE
DE BRASÍLIA
A superintendência regional do Incra no Amazonas
driblou uma lei federal relativa à reforma agrária e se valeu de poderes exclusivos da
presidência do órgão para arrecadar terras devolutas,
num total de 904 mil hectares -o equivalente a seis vezes a cidade de São Paulo.
De acordo com a legislação, compete exclusivamente ao presidente do Incra
(Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária)
arrecadar terras devolutas
(pertencentes ao Estado brasileiro) com o intuito de assentar famílias de trabalhadores sem terra.
De 2006 a 2008, a superintendente do Incra no Amazonas, Maria do Socorro Marques Feitosa, assinou pelo
menos três portarias para arrecadar áreas nos municípios
de Boca do Acre, Pauini e Lábrea, todos no Amazonas.
Nos três casos, Maria do
Socorro assinalou estar utilizando "a faculdade prevista
no artigo 28 da lei 6.383".
Esse artigo, contudo, prevê: "Sempre que se apurar,
através de pesquisa nos registros públicos, a inexistência de domínio particular em
áreas rurais declaradas indispensáveis à segurança e
ao desenvolvimento nacionais, a União, desde logo, as
arrecadará mediante ato do
presidente do Incra".
Ao emitir o ato de arrecadação das áreas devolutas,
com vistas à reforma agrária,
a União pode, em tese, atingir pretenso direito de posseiros e produtores rurais
que se apresentam como donos da terra, às vezes adquiridas anos atrás de terceiros
por boa-fé. Por esse motivo, a
competência para esse tipo
de ato fica concentrada nas
mãos do presidente do Incra.
Ouvido pela Folha, o Incra
em Brasília disse que as superintendências regionais
assinaram sete portarias do
gênero no Amazonas e duas
no Acre, com base no artigo
da lei 6.383. O órgão não informou datas das portarias
nem a extensão das áreas.
NULIDADE
Uma das portarias assinadas por Maria do Socorro tratou da arrecadação de 37,3
mil hectares no município de
Lábrea (AM). O advogado
João Tezza, contratado por
proprietários rurais que se intitulam donos de parte dessa
área e se dizem penalizados
pela portaria, recorreu à Justiça Federal para anular o ato
da superintendente do Incra.
"A portaria já nasceu eivada com o vício da nulidade,
ou seja, incapacidade do
agente que a editou", escreveu Tezza em ação acolhida
pela Justiça de Manaus (AM).
No final de outubro, o juiz
federal responsável pelo processo, Dimis da Costa Braga,
da 7ª Vara Ambiental e Agrária de Manaus, não acolheu o
pedido (de antecipação de
tutela) dos produtores rurais.
Ele não julgou o mérito do assunto, o que só deve ocorrer
ao final do processo, ainda
sem prazo para ocorrer.
"Não há provas inequívocas suficientes para arrostar
[afrontar] a presunção da legalidade dos atos contra os
quais se insurge o autor", escreveu o juiz.
Tezza entrou com recurso
no Tribunal Regional Federal
da 1ª Região. Para ele, "o Incra não tinha nem tem competência para "arrecadar sumariamente" terras particulares, até porque a legislação
desconhece o confisco".
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