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Literatura para incomodar
Com a obra "À Sombra do Cipreste" prestes a ganhar nova edição, Menalton Braff diz que função da literatura é provocar reflexão, e não dizer ao leitor: "seja feliz"
ELIDA OLIVEIRA
DE RIBEIRÃO PRETO
Angústia fina e secular.
Sonhos e vontades que não
se realizam. Cores, luzes,
sombras. Tristeza.
O clima que permeia os 18
contos de "À Sombra do Cipreste", de Menalton Braff,
72, vencedor do Jabuti em
2000, volta às livrarias na segunda quinzena de julho,
carregado de emoções como
a inquietude e a incerteza.
Reeditado agora pela Global Editora, "À Sombra..." estava esgotado havia cinco
anos. Um impasse entre a
editora anterior e Braff contribuiu para que o livro ficasse fora de circulação.
"A relação [do escritor]
com a editora é a mesma de
alguém com depressão que
procura cinco ou seis psiquiatras e, de repente, encontra um com o qual se
identifica", diz.
COMPASSO
O relançamento do livro
vem em um bom momento
para Braff. Ele está entre os
dez finalistas da categoria
principal do Prêmio São Paulo de Literatura e entre os 50
do Portugal Telecom de Literatura Brasileira -em ambos, concorre com o livro
"Bolero de Ravel", de 2010.
De acordo com o autor, o
romance possui a mesma estrutura narrativa presente no
compasso da música do francês Maurice Ravel (1875-1937): tambores de guerra ao
fundo da melodia lenta e sinuosa, marcados pelos instrumentos de sopro e cordas.
Amante de música clássica, Braff conta que só percebeu a semelhança estrutural
com a música quando a história já estava no terceiro capítulo. A partir de então, ouviu Ravel todos os dias.
O romance é sobre Adriano, 35, que sempre morou
com os pais. Com a morte deles, se depara com conflitos
internos e práticos com os
quais não sabia lidar. A irmã
Laura, 33, advogada de sucesso, se recusa a assumir o
papel de protetora.
O enredo caminha em direção à solidão, à loucura e à
obsessão, o que dá a deixa
para o escritor falar de um
sentido mais amplo da literatura. "Começo a escrever pelo desconforto, porque tem
algo me incomodando."
Para Braff, a função da literatura é provocar, pela reflexão, o crescimento pessoal
do leitor. "A literatura não
pode dizer: seja feliz, tenha
sonhos. Ela tem que dizer:
você está vivendo em um
mundo de merda, o que vai
fazer? Pense nisso", afirma o
escritor, que vive em Serrana.
OBRA
Gaúcho de Taquara, Braff
é autor de 17 livros. Entre eles
está também "A Muralha de
Adriano" (2008), outra obra
dele finalista do Prêmio São
Paulo. O romance ainda foi
um dos selecionados do Jabuti e menção honrosa do
Casa da América.
Esquerdista por ideologia,
Braff teve vida política durante o regime militar (1964-85). Acabou procurado pela
polícia durante a ditadura
por se envolver em atividades "clandestinas".
Por isso, os primeiros dois
livros foram publicados com
o pseudônimo de Salvador
dos Passos. "À Sombra do Cipreste" foi o primeiro a sair
com seu nome de batismo.
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