Ribeirão Preto, Domingo, 05 de Novembro de 2000

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CINEMA
Responsável por clássicos do terror, Rubens Lucchetti sobrevive produzindo livros populares em Jardinópolis
Roteirista de "Zé do Caixão" lamenta exílio



ANGELO SASTRE
EDITOR-ASSISTENTE DA FOLHA RIBEIRÃO

O roteirista Rubens Lucchetti, 70, que ganhou destaque após trabalhar com o cineasta José Mojica Marins nos filmes do personagem "Zé do Caixão", entre as décadas de 60 e 80, lamenta o "exílio" imposto pelos produtores de filmes nacionais.
Morando no interior de São Paulo desde 82 (hoje está em Jardinópolis), ele acabou se afastando do circuito cinematográfico no início desta década.
O último roteiro de Lucchetti para cinema -"O Gato de Botas Extraterrestre"- foi desenvolvido em 93. Só que o diretor Wilson Rodrigues não teve condições de concluir o trabalho em razão da falta de recursos.
Já os trabalhos com os diretores que o consagraram - Mojica e Ivan Cardoso- não são realizados há pelo menos dez anos. "Estou sem escrever para o Mojica desde 81. Para o Ivan, o último trabalho foi há dez anos."
Mesmo tendo escrito 20 roteiros, sendo metade somente na década de 70, e conquistado dois prêmios - Festival de Gramado e Rio Cine Festival -, Lucchetti dedica-se atualmente à produção de uma linha popular de "pocket books" (livros de bolso), que são assinados com pseudônimos .
"O meu grande erro foi ter vindo para o interior. Todo mundo me conhece, mas ninguém me liga. Devem imaginar que estou muito bem", diz Lucchetti.
Para ele, o mercado está voltado para os profissionais do eixo Rio-São Paulo.
"Mesmo com toda a praticidade que Ribeirão oferece me sinto isolado. O mundo gira em torno do Rio e de São Paulo. Fora de lá, o Brasil não existe", afirma.
A parceria com Mojica e o trabalho no cinema tiveram início em 67 -no filme "Trilogia do Terror" (episódio: "Pesadelo Macabro")-, mas a produção de textos de horror e de suspense acompanha o roteirista desde o início da década de 40.
Naquela época, Lucchetti escrevia textos como colaborador para revistas policiais -"X-9", "Detective", "Policial em Revista", "Contos Magazine", "Meia-Noite", "Suspense" e "Contos de Mistério"- e argumentos para radionovelas.
"Naquele tempo, eu conheci o Otávio Gabus Mendes em São Paulo, que comandava um programa de radionovelas. Ele gostava dos meus textos e comecei a enviar argumentos para ele utilizar no rádio", conta o roteirista.
A experiência levou Lucchetti a escrever scripts (roteiros) para programas na rádio PRA-7 de Ribeirão Preto e nas televisões Tupi e Bandeirantes.
A passagem por essas emissoras colaboraram para o aperfeiçoamento do roteirista, que era obrigado a desenvolver "técnicas" criativas para superar a falta de estrutura e de tecnologia.
"A minha formação é baseada na leitura de histórias em quadrinhos, folhetins e radionovelas. Essas linguagens exercitam muito a imaginação e a criatividade. Hoje, com toda essa tecnologia, as redes de televisão não produzem nada novo. Estamos em um processo de involução", relata.
Durante as décadas de 60 e 70, ele foi o responsável pelos scripts de programas como "Quem foi?" e "Além, Muito Além do Além".

Mestre
Mesmo longe do circuito cinematográfico, Lucchetti continua sendo considerado o grande mestre do suspense e do terror brasileiro.
Para o cineasta Ivan Cardoso, 48, que produziu três filmes com o roteirista, ele é um dos únicos do gênero no país.
"Infelizmente, o Lucchetti não é valorizado o suficiente. Nenhum outro profissional possui uma obra como a dele, que conta com mais de 20 roteiros para o cinema, milhares de livros (escritos sob pseudônimos) e histórias em quadrinhos. Em qualquer lugar do mundo ele seria um mito. Só no Brasil acontece esse tipo de coisa", lamenta Cardoso.
Por outro lado, o cineasta diz acreditar que a "marginalidade" é o grande charme do roteirista.
"Eu fui descoberto após redescobrir o Lucchetti. Ele é genial, mas se fosse um roteirista da Globo não teria graça", diz.
Para Cardoso, o grande mérito do roteirista é ter a capacidade de reunir elementos dos quadrinhos com a linguagem do cinema.
Junto com Lucchetti, ele produziu os filmes "O Segredo da Múmia", "As Sete Vampiras" e "O Escorpião Escarlate".
"Quando assisti "O Estranho Mundo de Zé do Caixão" fiquei perplexo com a qualidade do roteiro. Parecia um filme norte-americano. É uma pena que o cinema atual só tenha espaço para desfiles históricos", diz Cardoso.
Para o cineasta José Mojica Marins, a parceria com o roteirista representou um período positivo em sua carreira.
De acordo com o ele, o trabalho em conjunto resultou na produção de roteiros para 13 filmes, no programa "Além, Muito Além do Além" - exibido pela rede Bandeirantes-, na criação de livros e da revista "O Estranho Mundo de Zé Caixão".
"O Lucchetti é uma pessoa insubstituível. No gênero terror, é o roteirista perfeito. Ele colaborou demais comigo e representa muito para o cinema brasileiro", diz.
Depois de 19 anos, a parceria entre os dois deve ser retomada no próximo ano em um projeto a ser desenvolvido pelo cineasta .


Texto Anterior: Mortes
Próximo Texto: Parceria será retomada
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.