Ribeirão Preto, Domingo, 23 de agosto de 1998

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ARTIGO
Violência e criminalidade

CARLOS ADELMAR FERREIRA

Além da globalização, a violência e a criminalidade transformaram-se em temas de absoluta atualidade. Hoje, quando se fala em violência, por exemplo, não mais se pensa em algo distante, quase imaginário.
O que, de verdade, aconteceu? Como tratar dessas questões, sem desembocar em intelectualismo estéril?
Será que uma simples mudança de enfoque do setor público resolveria o "imbróglio", por meio de política pública de segurança mais coerente?
A resposta seria afirmativa, se formulada décadas atrás. Hodiernamente, poucas pessoas restariam concordes, dentro outros motivos, em razão do minimismo estatal e, consequentemente, da perda da capacidade do Estado em resolver problemas de forma unilateral.
Carentes de profundidade, alguns aferram-se à adoção de duvidosas medidas paliativas.
Dentre elas, poderíamos invocar a chamada teoria de tolerância zero para a redução da criminalidade, à guisa de pesados investimentos financeiros em todo o sistema de segurança pública, o que poderia resultar em importantes recuos na criminalidade.
Todavia, trata-se de operar nos efeitos, ignorando as reais causas.
Vivemos numa sociedade cujo grau de complexidade tende a ampliar-se.
Medidas tópicas carecem da indispensável consistência requerida por soluções duradouras.
Ademais, questões complexas anseiam por providências que abranjam uma maior diversidade.
Medidas de puro cunho jurídico-policiais não são suficientes "per si".
Torna-se indispensável o manejo de vasta gama de ações multidisciplinares, que implicaria no envolvimento de educadores, psicólogos, antropólogos, sociólogos, criminalistas, policiais, políticos e juristas, além de outros profissionais que militam nas ciências humanas.
Há que se agregar também as importantes contribuições permitidas pelas ciências exatas. Não se trata, portanto, de solução simplista.
Sua análise, primeiro de tudo, enseja considerar que a resolução da problemática passa pela conscientização da comunidade, que deve querer e saber enfrentar os males que lhe afligem e impõem desafios inquietantes.
A sociedade necessita aglutinar forças para o controle da violência e da criminalidade.
Não resolve delegá-lo apenas a profissionais do ramo. Do contrário, o problema teimosamente persistirá.
No atual cenário, o cidadão precisa reescrever "O Contrato Social", de Rosseau.
Não basta, por conseguinte, optar pela cômoda atitude de delegar direitos e deveres do Estado.
A violência e a criminalidade estão entranhadas no tecido social e o seu adequado tratamento exige, em princípio, uma efetiva mudança de atitude.
Mudança traduzida no abandono da passividade em prol de uma atitude proativa.
A segurança pública não pode permanecer apartada do modo de vida da sociedade moderna.
As pessoas precisam cultivar práticas saudáveis de convivência coletiva em detrimento do usufruto egoístico de prazeres individuais, que vêm marcando o presente modo de ser.
Aliás, estudos indicam que a criminalidade dispõe de campo fértil numa comunidade de baixa integração.
Com efeito, torna-se indispensável buscar-se revitalizar as formas e organismos sociais da participação, valorizando os benefícios da vida em comum.
As nações avançadas caracterizam-se por elevada participação voluntária, pilastras de regimes democráticos e livres. Nelas, o capital social (potencial humano) faz a diferença...


Carlos Adelmar Ferreira, 48, é coronel da Polícia Militar de Ribeirão Preto e comandante do policiamento de área dos municípios da região de Ribeirão



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