São Paulo, segunda-feira, 01 de fevereiro de 2010

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Romance virtual

Com a escrita frequente, eles melhoram a gramática, a ortografia e o seu estilo, enquanto sonham em se tornar profissionais

Adolescentes escrevem livros inteiros em comunidade no Orkut que já conta com mais de 3.000 participantes

Rodrigo Capote/Folha Imagem
A estudante Maria Eugênia Geve, 14, mostra a página de seu livro virtual "Missão Princesa", no site de relacionamentos Orkut

FABIANA REWALD
DA REPORTAGEM LOCAL

Douglas, 16, está escrevendo o último livro de sua trilogia. Maria Eugênia, 14, acaba de terminar o seu primeiro romance e já começou a redigir o segundo. Nilsen, 18, está revisando o seu livro de estreia e, enquanto não o publica, abastece seus leitores com contos.
Integrantes de uma geração que parecia fadada a trocar a leitura pelo bate-papo no computador, os três adolescentes fazem parte de uma turma que decidiu unir tecnologia e literatura e hoje escreve mais que muito autor profissional.
Enquanto não caem nas graças de uma editora, eles colocam os textos em uma comunidade no Orkut que já tem mais de 3.000 participantes.
Criada há dois anos, a comunidade Nossos Romances Adolescentes tornou-se quase uma incubadora de jovens autores. No site de relacionamentos, eles publicam os livros em capítulos, que são lidos e comentados pelos outros participantes, quase todos escritores.
Estudante de jornalismo, Nilsen Silva é a dona da comunidade e, com a ajuda de outros mediadores, decide o que será publicado. Douglas Marques é um dos escritores mais festejados. Ele afirma que "Nebulosa", o primeiro livro da trilogia, já foi baixado umas 600 vezes.
Maria Eugênia Geve reúne leitores -na maioria garotas- de nove a 20 anos, que adoram comentar as aventuras da sonhadora Sofia em "Missão Princesa", de mais de 400 páginas. Em seu segundo livro, "Refugo du Soleil", a mocinha é "a mais desiludida das desiludidas", segundo Maria Eugênia.
Em comum, além do gosto pela leitura e do sonho de ganhar a vida escrevendo, os três jovens contam que, escrevendo os textos, melhoraram em gramática, ortografia e estilo.
A evolução foi notada pela professora de português de Maria Eugênia no Pueri Domus. "Ela gosta muito de ler e isso se reflete na escrita dela", diz Regiane Magalhães.
Luciana Ruffo, do NPPI (Núcleo de Pesquisa da Psicologia em Informática) da PUC-SP, lembra que uma das funções dos sites de relacionamentos é a educativa, na medida em que as comunidades aproximam pessoas que têm um mesmo interesse, sobre o qual passam informações umas para as outras.
No entanto o uso da redes sociais no ensino formal, nas escolas, ainda não é muito disseminado, segundo especialistas em educação consultados.
"Há um distanciamento entre o que a escola pede [como produção literária] e a escrita real", que é aquela que faz parte do cotidiano dos alunos, seja na internet ou no papel, afirma Ezequiel Theodoro da Silva, professor-colaborador voluntário da Faculdade de Educação da Unicamp e criador do site Leitura Crítica.
Ataliba de Castilho, linguista e consultor do Museu da Língua Portuguesa, completa: "Hoje as crianças escrevem muito mais do que antes, por um estímulo próprio. Isso vai contra quem diz que a internet vai acabar com a escrita."
No caso de Igor Ferreira, 29, a internet se tornou um poderoso meio para divulgar seus poemas e contos. Criado em 2005, o seu e-book de poesias "Palavras-Chave" já teve milhares de downloads. O técnico de informática e escritor amador também publica seus textos em blogs. "A internet permite que as pessoas quebrem o paradigma das editoras."

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