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"Lancet" se retrata por artigo que ligava vacina a autismo
Publicação deflagrou paranoia mundial contra imunização de crianças
HÉLIO SCHWARTSMAN
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS
O periódico médico "The
Lancet" decidiu ontem se retratar da publicação do artigo
que, 12 anos atrás, ligou a vacina tríplice viral (sarampo, rubéola e caxumba) a casos de autismo, deflagrando uma onda
mundial de paranoia contra a
imunização de crianças.
Em breve nota, o periódico,
um dos mais influentes do
mundo, diz que, após julgamento pelo Conselho Médico
britânico, cujo veredicto saiu
no dia 28, ficou claro que o artigo do gastroenterologista Andrew Wakefield e outros continha erros e que, por isso, suprimia-o de seus registros.
A retratação é extemporânea. O texto de Wakefield, que
gerou um volume inédito (e
desnecessário) de pesquisas
com o objetivo de provar a segurança das vacinas, já havia há
muito caído em descrédito.
Não obstante, em especial no
Reino Unido e nos EUA, surgiram grupos antivacinação que
sustentam que a imunização
causa autismo. Cada vez que
sua hipótese para explicar tal
efeito é derrubada, eles rapidamente encontram outra.
No artigo, em que descreveu
o caso de oito pacientes, Wakefield dizia que a vacina provocava uma infecção intestinal
que facilitava a entrada de proteínas encefalotóxicas na corrente sanguínea. No cérebro,
elas desencadeariam autismo.
Vários estudos destruíram o
trabalho com argumentos metodológicos e epidemiológicos.
Wakefield também é criticado
por não ter revelado que era dono da patente de uma vacina rival. No ano passado, J. Gerber e
P. Offit publicaram uma boa revisão do caso no "Clinical Infectious Diseases".
Surgiu então a teoria do mertiolate, lançada por uma consultora de marketing e uma enfermeira. Seus adeptos sustentam que o mercúrio presente
no mertiolate que era usado como conservante em algumas
vacinas causava o autismo.
Depois de quatro anos de trabalho e oito relatórios em que
se avaliaram mais de 200 estudos, um comitê especial convocado pela vigilância epidemiológica dos EUA concluiu que a
teoria do mertiolate não se sustentava sob nenhum aspecto.
Veio, então, a teoria de que
múltiplas vacinações enfraquecem o sistema imune, facilitando o surgimento do autismo.
No Brasil, felizmente, a moda
antivacinas não pegou. Mas os
EUA e o Reino Unido tentam
até hoje recuperar-se dos estragos provocados pelo artigo de
Wakefield e a histeria que se seguiu. As taxas de vacinação caíram e casos de sarampo voltaram a subir. A rubéola e a caxumba também reapareceram.
A prevalência do autismo,
evidentemente, não caiu.
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