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Meia elástica não evita formação de trombose venosa
Conclusão é de um estudo internacional que avaliou 2.518 pessoas imobilizadas após terem sofrido AVC isquêmico
Recomendação de uso da
meia é "universal" entre os
pacientes hospitalizados
com mais de 40 anos; atuais
diretrizes são questionadas
FERNANDA BASSETTE
RACHEL BOTELHO
DA REPORTAGEM LOCAL
Ao contrário do que recomendam as diretrizes médicas,
o uso de meias elásticas em pacientes que estão sem mobilidade nas pernas não previne a
formação de coágulos.
Os dados são de uma pesquisa internacional com 2.518 pacientes que sofreram AVC (acidente vascular cerebral) isquêmico e estavam imobilizados.
Os resultados foram publicados neste mês no periódico
"Lancet" e devem provocar
mudanças na prática médica.
O estudo avaliou pacientes
de 64 centros no Reino Unido,
Itália e Austrália. Metade deles
usou meias elásticas durante o
tratamento e metade ficou sem
elas. Depois de sete e de 30 dias,
esses pacientes foram submetidos a um ultrassom das pernas.
Os resultados dos exames
mostram que houve formação
de coágulos em 10% daqueles
que usavam meias e em 10,5%
dos que não usavam -diferença estatisticamente irrelevante, que coloca em dúvida a eficácia das meias.
Além disso, os pesquisadores
apontam que 5% dos pacientes
que usaram as meias elásticas
apresentaram úlceras, bolhas e
tiveram morte do tecido da perna em comparação com apenas
1% daqueles que não usaram.
Segundo Pedro Puech Leão,
cirurgião vascular do Hospital
Sírio-Libanês, a recomendação
de usar meias compressoras
em pacientes que sofreram um
AVC "nunca fez muito sentido
porque as meias atuam muito
bem nas veias superficiais, mas
as tromboses perigosas ocorrem nas veias profundas".
Ele acredita que a conclusão
da pesquisa pode ser válida
também para outras pessoas
imobilizadas em UTIs ou que
estejam no pós-operatório de
grandes cirurgias. "Muitas pessoas que usam as meias provavelmente não precisam delas."
Indicação controversa
Para o coordenador médico
do CTI do hospital Albert Einstein, Nelson Akamine, o estudo
tem potencial para mudar as
diretrizes atuais. "Nesse grupo
de pacientes, o uso de meias
não previne a formação de coágulos e ainda acrescenta riscos
e custos. É o que se chama de
uma intervenção fútil", diz.
O médico estima que a maioria das pessoas que fica hospitalizada por mais de um dia use
a meia. "O impacto econômico
disso é brutal, são centenas de
milhares de casos por ano." O
preço (de R$ 70 a R$ 170) varia
de acordo com o fabricante e
com o grau de compressão.
Apesar de o estudo mostrar a
ineficácia da meia em pessoas
imobilizadas, o cirurgião vascular José Carlos Costa Baptista
Silva, presidente da Sociedade
Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular (regional São
Paulo), diz que vai continuar
recomendando o uso a seus pacientes, pelo menos até que outras pesquisas cheguem ao
mesmo resultado.
"Até agora acreditávamos
que as meias eram eficientes
como profilaxia para pacientes
acamados. É complicado parar
de usar de uma hora para outra.
Não vou deixar de indicar porque mal elas não fazem, desde
que sejam usadas corretamente", afirma o médico.
Segundo ele, o aparecimento
de bolhas, feridas e úlceras nos
participantes que usaram a
meia pode ser atribuído ao uso
inadequado. "O correto é tirá-las todos os dias, limpar a pele e
fazer fisioterapia. Se a pessoa
perceber algum problema, o
uso é suspenso. Isso é o básico
do básico", diz Silva.
Retorno venoso
Ainda de acordo com o presidente da SBACV, as meias elásticas têm a função de manter a
contração muscular das pernas
do paciente e, assim, facilitar o
retorno venoso do sangue para
o resto do corpo.
Em pessoas saudáveis, os
músculos das pernas cumprem
essa função, mas o paciente
imobilizado perde a capacidade
de contração do músculo e não
há retorno venoso. Assim, o
sangue fica acumulado -o que
provoca a trombose.
"Se um pedaço desse coágulo
soltar, ele pode subir pela veia e
alcançar o pulmão, provocando
uma embolia", diz. Cerca de
20% das pessoas que têm trombose terão embolia.
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