São Paulo, domingo, 06 de junho de 2010

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"O que esperamos? Que essas pessoas fiquem quietinhas?"

COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

O desconforto de encarar a morte estampada na tela está relacionado à forma como encaramos esse fato da vida.
"Esses blogs chocam porque não suportamos a dor do outro. O que esperamos, que esses pacientes fiquem quietinhos?", provoca o psicanalista Roosevelt Cassarola, autor de "Da Morte" (Papirus).
Para Roosevelt, fazer a classificação "pobre e preconceituosa" de exibicionismo é um erro. "Todo mundo precisa ser visto para existir."
Como as doenças terminais (o termo politicamente correto é "sem possibilidades terapêuticas") tolhem a autonomia, o blog vira um espaço de atuação. Como diz Luciana Holtz: "Ali o paciente pode mandar".
E pode editar também, fala Roosevelt. "Há textos tão otimistas que parecem negação da realidade. Mas a pessoa tem o direito de esconder o que quiser, cada um dosa o quanto quer se expor."
É o que faz a estudante Bruna Souza, 20, em seu blog Linfoma Emocional (http://linfomaemocional.blogspot.com/). Quando seu namorado, Tadeu, iniciou o Linfomaníaco (http://linfomaniaco.blogspot.com), para falar de seu câncer, Bruna criou um blog paralelo.
"No meu blog, como o Tadeu sempre fazia no seu, tento mostrar um lado positivo, para deixar a situação mais leve para quem a vive e para quem lê", diz Bruna.
Tadeu postou, em 21 de dezembro último, a esperança de uma "medula limpa" no Natal. Morreu menos de um mês depois. O blog dele continua no ar. E Bruna tenta manter o seu, como dá.
"Quero continuar o meu blog para ajudar pessoas que passam por situações parecidas. Agora estou mal, não consigo escrever coisas "pra cima", então estou dando um tempo. Quando a vida melhorar, eu volto", diz.
O blog pode ajudar, segundo Silvana Maria Aquino, psicóloga especializada em cuidados paliativos. "Ele facilita a expressão, ventila emoções dessa fase. Acaba tendo caráter terapêutico."
E deixa uma marca. Dizia-se, antes, que para morrer em paz era preciso ter filho, escrever livro e plantar árvore. Hoje, talvez baste um blog.


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