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HOMEM EM OBRAS
"As lésbicas são mulheres, eu não sou"
Fonseca está em transformação há dois anos, desde que descobriu o tratamento e a existência de pessoas como ele
Enquanto não faz a cirurgia, transexual usa várias camisetas e uma faixa para apertar os seios sob o terno
DE SÃO PAULO
Depoimento de Renato
Fonseca, 43, nascido Rosane
Oliveira da Fonseca. Profissão: serigrafista. Casado há
11 anos. Vive em Porto Alegre.
Eu nasci em um corpo errado. Meu pai é funcionário
público aposentado e a mãe é
dona de casa e costureira.
Sempre fui assim, desde
criança. Quando cheguei aos
18, saí de casa para me assumir plenamente.
Todas as pessoas como eu
tiveram problema com a
mãe. O pai em geral não está
nem aí. A mãe é que é mais
complicado.
Nunca vesti roupas de menina. Na escola, a sorte era
que o uniforme era abrigo e
tênis -graças a Deus. Sempre tive apelidos masculinos
(Falcão, Rique). E só brincava com os meninos.
Se você me olha, você vê
claramente que sou um homem. Lésbicas são mulheres.
Eu, não. Me sinto como homem. Penso como um.
Os homens são mais grosseiros. As mulheres são mais
delicadas, mais cheias de ai-ai-ai. Eu não sou assim. Comigo é tudo na base dos
trambolhões.
Aos 16 anos, namorei pela
primeira vez uma mulher.
Ela tinha 26 e sempre me tratou como um menino.
Na minha empresa, todo
mundo sabe que nasci mulher, mas me chamam de
Fonseca. E estão acompanhando a minha transformação. Estou criando barba, bigode, a voz está engrossando
cada vez mais. E está todo
mundo tranquilo.
Se eu soubesse que havia
esse tipo de tratamento [hormonal, para o desenvolvimento de caracteres secundários masculinos], teria ido
antes. Há dois anos estou lá.
Quando cheguei, foi uma
felicidade. Até então eu só
conhecia lésbicas, heterossexuais e transexuais que querem ser mulheres.
De dois anos para cá, já encontrei umas 15 pessoas como eu. E está aparecendo cada vez mais gente.
Eu fiquei feliz de saber que
isso era possível. Quando eu
vi o Paulo, braços cabeludos,
barba... Ali estava alguém
que tinha sido uma guria. Era
uma transformação incrível.
A parte de cima me incomoda muito. Para mim, não
faz parte. Eu chego em um lugar, de barba e bigode, e está
tudo ok. Mas quando a pessoa vê o peito, começa a me
estranhar: isso aí é um homem ou uma mulher? Se eu
não tiver o peito, ela não vai
pensar assim.
Meu peito é tamanho médio, mais ou menos, nem sei
direito. Eu não me olho muito. Para esconder o peito, uso
três camisetas, faixa para
apertar e terno.
Em março de 2009, comecei a fazer o tratamento hormonal. De lá para cá, a minha voz engrossou mais. Fiquei um pouco mais agressivo, mais possessivo, mais estourado. Já estou com barba
e bigode, com pelos na barriga. Parou a menstruação.
Aumentou a minha libido e
meu clitóris cresceu. Está do
tamanho do dedo mindinho.
Tem gente no grupo [de
transexuais como Renato]
que tenta fazer xixi de pé,
mas para mim isso não importa.
Minha esposa -sou casado há 11 anos com uma mulher muito feminina- diz
que não tem necessidade de
eu fazer a operação na parte
de baixo. Ela já está bem contente [risos].
Hoje, eu entrei no banheiro e olhei meu rosto no espelho. Que alegria ver todos
aqueles pelos da barba. Já é
uma transformação e tanto,
mas quero chegar em um tórax sem peito e todo peludo.
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