São Paulo, domingo, 15 de novembro de 2009

Próximo Texto | Índice

HISTÓRIA

Ela quase perdeu o útero

Cristiane Faccioli, 31, ia ao hospital todo mês por causa das cólicas geradas por três miomas; após quase perder o útero, passou por um tratamento menos invasivo e conseguiu ser mãe

Caio Guatelli/Folha Imagem
Cristiane Faccioli com a filha, Maria Laura

FLÁVIA MANTOVANI
EDITORA-ASSISTENTE DO EQUILÍBRIO

Durante toda a adolescência e o início da vida adulta, Cristiane Faccioli, 31, ficava ao menos quatro dias no mês "fechada para balanço". O fluxo menstrual era tão intenso que ela usava dois absorventes e os trocava a cada meia hora. Tinha tanta cólica que perdia o movimento das pernas.
Invariavelmente, ia parar no hospital para tomar remédio na veia -os comprimidos tradicionais eram como "água com açúcar", conta.
Nesse período, não conseguia fazer nada: quando adolescente, pedia para a mãe buscá-la onde estivesse e faltava às aulas. Mais tarde, começou a trabalhar como advogada e precisava cancelar reuniões e audiências. "O problema complicava minha vida profissional absurdamente. No primeiro dia de menstruação eu já desmarcava reuniões. Tinha que pedir a um colega que fosse às audiências no meu lugar", diz.
Como se sentia assim desde que começou a menstruar, achava aquilo natural. Os médicos diziam que o que ela tinha era algo normal da adolescência e passaria.
Mas foi só piorando e, na época da faculdade, o problema agravava-se com o estresse. Até que, aos 26 anos, Cristiane teve uma hemorragia que durou três meses. Foi seu período mais crítico. "Resolvi dar um basta. Não dava para viver daquele jeito", afirma.
Mudou de ginecologista e a nova médica lhe receitou um remédio anti-hemorrágico. Era para tomá-lo por poucos dias, mas ela o usou continuamente por mais três meses, porque sempre que parava de tomar o sangramento voltava.
Foi quando a ginecologista pediu um ultrassom e detectou o que estava causando todos os problemas: ela tinha três miomas, tumores benignos que se formam no útero e, em alguns casos, podem provocar os sintomas que incomodavam Cristiane desde nova.
A advogada ficou assustada com o que ouviu da médica: teria que passar por uma histerectomia, ou seja, a retirada do útero. "Falei que não ia fazer aquilo. Eu tinha 24 anos, nem tinha casado, queria ter filhos."
Foi seu namorado na época, hoje seu marido, que leu numa revista informações sobre a embolização de miomas, técnica existente há cerca de dez anos que trata o problema de forma menos invasiva.
Cristiane buscou um especialista no procedimento e ouviu dele respostas tranquilizadoras. "Perguntei: "Não vou ter mais cólica? Nem hemorragia?" Ele respondeu que não. "Vou poder ter filhos?" Ele disse que sim. Nem acreditei."
O tratamento não deixa cicatrizes, exige anestesia local e só um dia de internação -para controlar a dor, frequente no pós-operatório. A eficácia é de 95% a 97%. A melhora foi imediata. "Nunca mais tive cólica ou sangramentos anormais. Vi o que é ter uma vida normal", diz Cristiane.
Um ano depois, os miomas estavam de tamanho insignificante. O médico disse que ela poderia demorar a engravidar, mas, com dois meses de tentativa, deu certo. Hoje, ela é mãe de Maria Laura, de três meses.
Até o sexto mês de gravidez, os miomas apareciam no ultrassom, com o bebê. O ginecologista queria retirá-los definitivamente no parto, aproveitando que teve que ser cesariana. "Eu estava na sala de parto com a minha filha e falava: "Não esquece os miomas'", conta ela, rindo. Mas ele não conseguiu encontrá-los: seu organismo já os havia absorvido.

Sintomas
Ao menos metade das mulheres com idade entre 30 e 45 anos apresenta miomas. A questão é que a maioria delas não tem nenhum sintoma. "Muitas vezes eles passam desapercebidos e só vão ser notados em exames de rotina", diz o radiologista intervencionista Nestor Kisilevzky, especialista na embolização de miomas.
Ele ressalta que o mioma é totalmente benigno -"ninguém morre por causa dele e ele não se transforma em câncer". Só devem ser tratadas -com qualquer técnica- as mulheres que têm sintomas.
"O mioma pode ter um impacto severo na qualidade de vida. Há pacientes que precisam usar até fraldas [para conter o sangramento]", diz.
Ele afirma que muita gente acaba perdendo o útero desnecessariamente porque alguns ginecologistas não orientam as pacientes de que é possível fazer a embolização. O procedimento não é coberto pelo SUS.
Em 2008, Kisilevzky fundou, com o hospital Albert Einstein, onde trabalha, um projeto que fazia embolizações gratuitas em quatro hospitais públicos. Foram tratadas 106 pacientes, mas hoje o projeto está suspenso para buscar uma ampliação. Já há uma lista de espera de 300 mulheres que querem se submeter ao procedimento.


Próximo Texto: Frase
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.