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Hospitais não controlam antibióticos
Ministério Público identificou falhas em mais de um terço das instituições públicas e privadas do Estado de SP
Prescrições sem critério causam o surgimento de superbactérias, que estão resistindo até às drogas mais modernas
CLÁUDIA COLLUCCI
DE SÃO PAULO
Mais de um terço (35,4%)
dos hospitais públicos e privados do Estado de São Paulo não controla o uso de antibióticos, prática determinada por lei federal e pelo CFM
(Conselho Federal de Medicina) há mais de dez anos.
O descontrole é apontado
como uma das principais
causas do aumento da resistência bacteriana.
O dado faz parte do maior
levantamento já feito no Estado sobre o controle da infecção hospitalar, coordenado pelo Ministério Público
Estadual e pelo Cremesp
(Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo).
O relatório final, que envolveu 158 hospitais paulistas, foi lançado na semana
passada. Os nomes dos hospitais que registraram falhas
no controle dos antibióticos
não foram revelados.
Segundo o estudo, em
38% dos hospitais pesquisados não há um manual de
orientação de prescrição de
antibióticos, que deveria ser
elaborado e atualizado pela
CCIH (Comissão de Controle
de Infecção Hospitalar).
Essa comissão tem conhecimento, por exemplo, das
bactérias que estão circulando dentro do hospital e dos
antibióticos mais ativos.
Resolução do CFM de 1999
determina que as prescrições
de antibióticos obedeçam às
regras ditadas pela comissão
de controle de infecção, que
tem o poder até de vetar a
prescrição de um outro médico, desde que amparada em
protocolos científicos.
Mas, na prática, isso não
funciona. Em geral, quando
os pacientes não respondem
a uma terapia antibiótica, os
médicos simplesmente alteram a prescrição por outro
antibiótico e aguardam o resultado, sem comunicar a comissão sobre a mudança.
"É um absurdo as proporções desse descontrole da
antibioticoterapia. Se os hospitais tivessem CCIHs atuantes, isso não estaria acontecendo. Já tem lei, já tem resolução, não sei mais por onde
a gente pode cercar para melhorar isso", diz o infectologista Caio Rosenthal, conselheiro do Cremesp.
Pare ele, um dos fatores
que ainda gera o descontrole
dos antibióticos no ambiente
hospitalar é a "vaidade médica". "Muitos médicos não admitem interferência na prescrição de antibióticos. São
vaidosos. Outros são mais lúcidos e até procuram as
CCIHs para discutir o caso."
Mas não é o que rotineiramente acontece, segundo o
infectologista Artur Timerman, responsável pela comissão de controle de infecção do Hospital Edmundo
Vasconcellos, em São Paulo.
"Somos ainda vistos como
os vilões, os chatos que querem proibir os antibióticos."
A prescrição sem critério
dos antimicrobianos leva ao
surgimento das superbactérias. Em UTIs de hospitais
públicos e privados paulistas
circula a bactéria kpc (Klebsiella pneumoniae carbapenemases), resistente até aos
antibióticos mais modernos.
"O surgimento dessa bactéria e de outras superpoderosas tem tudo a ver com a
pressão seletiva causada pelo uso inadequado de antibiótico", avalia Timerman.
Segundo ele, o maior problema está na utilização incorreta dos antibióticos profiláticos, usados para prevenir infecções pós-cirúrgicas.
"Normalmente, você dá uma
dose antes da cirurgia e outra
de seis a oito horas depois.
Mas muitos profissionais têm
dado antibiótico errado e pelo tempo errado."
De acordo com Didier Pittet, diretor da OMS (Organização Mundial da Saúde) para a segurança dos pacientes,
a verdadeira pandemia mundial hoje é a resistência a antibióticos. "É uma epidemia
silenciosa e uma bomba com
detonação retardada."
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