São Paulo, domingo, 28 de fevereiro de 2010

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MODA

Uma tarde de inverno com Diane von Furstenberg em seu castelo de vidro

por ALCINO LEITE NETO, de Nova York

NO QUARTO, COM DIANE

Serafina visitou o quartel-general da Burguesa que virou princesa que virou estilista

O escritório de Diane von Furstenberg está agitadíssimo.Faltam só três dias para o desfile da estilista na semana de moda de Nova York (ocorrido no último dia 14). Funcionárias passam de um lado para outro, carregando vestidos e outros adereços. A sala é ampla, decoração contemporânea e uma infinidade de móveis e objetos. Num canto, a estátua de um Buda, cercada de flores, como um pequeno altar. Em outro, centenas de fotos pessoais. Numa das paredes, o retrato que Andy Warhol fez da estilista nos anos 1970.
Da varanda do escritório avistam-se os telhados ocres, cobertos de neve, do Meatpacking District, a antiga região de matadouros em Nova York que se tornou lugar da moda.
Diane Simone Michelle Halfin nasceu em Bruxelas (Bélgica), filha de uma família judia. Seu sobrenome atual veio do primeiro marido, o príncipe alemão Egon von Furstenberg –com quem teve dois filhos, Alexander e Tatiana. Ela estudou economia, trabalhou na indústria têxtil italiana e em edições de livros na França. Abriu sua primeira grife nos anos 1970. Em 2002, naturalizou-se americana. Hoje é um dos nomes mais incensados da moda.
No dia 26 de março, Diane abre sua primeira loja no Brasil, no shopping Iguatemi. Entre 9 de abril e 8 de maio, o shopping também fará uma exposição sobre a estilista.
Diane finalmente entra no escritório. Está vestindo blusa preta justa e calça com estampa "animalier". Nos pés, apenas um par de meias. Os cabelos longos estão soltos e o seu rosto praticamente não tem maquiagem. Os olhos fixam firmemente o interlocutor. Seus movimentos são espontâneos, rápidos e joviais –parece ter bem menos que 63 anos.
Como o escritório está barulhento, Diane sugere um outro lugar para a entrevista: "Vamos para o meu quarto!"

O CASTELO DA PRINCESA
Antes que cheguemos lá, é preciso falar um pouco desse quarto. Quando mandou fazer seu quartel- general no Meatpacking, Diane construiu um poliedro inteiramente de vidro na cobertura, como se um óvni tivesse aterrissado no prédio de três andares. A parte baixa desse poliedro está ligada ao escritório da estilista. A alta é o quarto de dormir.
Da rua, é possível avistar o quarto. Há fotos aéreas, mas é raríssimo que Diane deixe fotografar por dentro o local –que se tornou um espaço quase mítico para o meio da moda.
A estilista me conduz por um corredor. Subimos alguns degraus e chegamos ao quarto. É como uma cápsula de vidro de cerca de 50 m2. As janelas têm longas cortinas, que estão abertas, com uma vista extraordinária do "skyline" de Nova York. Uma cama com dossel e cortinas brancas domina o local. Tudo é charmoso e acolhedor. Ao mesmo tempo, lembra uma nave espacial, como se fosse zarpar para o cosmos a qualquer instante.
"Quando vim para o Meatpacking, disseram que eu era louca, que aqui só tinha açougueiros e travestis. Na verdade, eu praticamente lancei esse bairro", ela afirma, recostada à vontade em sua cama.
Eu ouço tudo atentamente, sentado em um belo, moderníssimo, mas desconfortável, divã vermelho.
"Quando estou em Nova York, esse lugar é minha casa. À noite, apago a luz e posso ver o brilho da cidade. É sublime. Mas meu verdadeiro lar fica no interior, em Connecticut."
Ela diz que adora a solidão. "Em uma certa idade, é preciso ficar um pouco sozinha."
Lá embaixo, sua loja parece desconhecer a crise que atingiu a moda americana. "Minhas roupas não são caras, por isso fui pouco afetada", explica. Diane também preside o influente Conselho de Designers de Moda dos EUA. Poucos dias antes do início da fashion week nova-iorquina, o conselho reuniu especialistas para discutir a saúde das modelos. "Não podemos ter meninasß tão jovens nas passarelas, com corpos ainda em formação", afirma Diane. "Com menos de 13, 14 anos, às vezes muito magras, elas dão um falso exemplo às mulheres." Segundo ela, Nova York deverá proibir modelos menores de 16 anos nas passarelas –como já ocorre nas semanas de moda brasileiras.
O quarto de Diane também fascina pela vasta coleção de objetos que decora o lugar. Muitos vieram de viagens que ela fez por toda parte. "Jet-setter" nos anos 1960 e 1970, correu o mundo. Em 1972, visitou o Brasil pela primeira vez. "Fui para o Carnaval, ainda havia o baile do Municipal", recorda.
Pouco tempo depois, ela se apaixonou por um brasileiro que conheceu em Bali e de quem só revela o prenome: Paulo. A relação durou cinco anos. "O que gosto mais nos brasileiros é que eles são abertos, livres e lindos. Eles amam a vida."
De repente, ela salta da cama. Praticante de ioga, tem a flexibilidade de um felino. "Preciso voltar ao trabalho", diz. Eu me levanto com pesar do divã vermelho.
Por mim, eu ficaria aqui para sempre, olhando o inverno gelado de Manhattan do alto do paraíso da princesa Diane.

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