São Paulo, quarta-feira, 28 de setembro de 2011

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ANDRÉ CONTI

15 horas em 8 minutos


Os grandes jogos não são os mais longos, mas os que proporcionam um maior sentimento de imersão

IMPOSSÍVEL CONTABILIZAR as horas que passei jogando Caçadores da Arca Perdida no Atari 2600. Para terminar a fita, era preciso percorrer dezenas de telas, encontrar passagens secretas, negociar com comerciantes e evitar ladrões e cobras. Descobrir a localização exata da arca foi um suplício de meses.
Esses dias vi no YouTube um sujeito acabando a fita em oito minutos. Claro que parte da graça do jogo estava em descobrir o que precisava ser feito, coisa que ele já sabia, mas, mesmo assim... Oito minutos.
O tamanho de um jogo é algo relativo. Os resenhistas americanos, por exemplo, valorizam imensamente a duração de um jogo ao avaliá-lo. É comum que um título que só recebeu elogios tome uma nota mais baixa por ter "apenas 20 horas" ou um mapa pequeno demais.
Essa valorização do custo-benefício sobre outros aspectos do jogo acaba forçando as produtoras a espichar desnecessariamente seus títulos e a embutir conteúdo adicional. E dá-lhe modo multijogador mal-ajambrado e itens colecionáveis escondidos dentro das fases.
Os jogos tradicionalmente mais longos são os de mundo aberto ou exploração, em que o jogador não segue um esquema rígido de fases, mas explora cenários e realiza diversas missões no ritmo que quiser.
Alguém que atravesse apenas a história principal pode terminá-lo em 20 horas. Mas também é possível percorrer caminhos alternativos e missões paralelas, dobrando ou triplicando esse tempo.
Esses jogos não são longos sem razão. Quem acompanha a série Elder Scrolls, por exemplo, espera mundos gigantescos, dezenas de calabouços e cidades, além de centenas de personagens para conversar. Mas ninguém passaria sabe-se lá quantas horas investigando cada cantinho dos jogos, se não fosse o enorme sentimento de imersão proporcionado pelo escopo da série.
Por isso é fácil identificar jogos espichados só para atender a essa demanda imaginária por tempo. Foi o caso de Zelda: The Wind Waker, título de 2003 para o Gamecube.
Por conta da data de lançamento, a Nintendo foi obrigada a cortar duas fases grandes durante o desenvolvimento, mas resolveu preencher o tempo repetindo uma missão -que já era tediosa na primeira vez- logo antes do fim. São duas horas de horror até retomar o eixo.
Um bom jogo de futebol ou de luta pode ter uma vida de dez anos (ou um ano, como querem as produtoras), mas nem sempre um jogo narrativo ou com fases se beneficia de uma duração mais longa. Os independentes têm acertado esse equilíbrio: ideias simples e bem executadas (e com o preço de acordo) costumam dar certo.
Mas não me importo em pagar o preço "cheio" por um jogo curto. Um dos meus favoritos, Beyond Good and Evil (disponível em versão HD na PSN Store e na Xbox Live) não chega a 15 horas, quase um espirro.
Hillys, o mundo de Beyond Good and Evil, pode ser minúsculo perto de Elder Scrolls, mas é tão rico em detalhes que o sentimento de imersão é o mesmo. A trama não dá passo em falso, e a exploração "opcional", que consiste em fotografar a fauna de Hillys, serve para complementar o jogo, e não prolongá-lo.
Quinze horas que passam em oito minutos.

chorume.org

@andre_conti


LULI RADFAHRER
Leia a coluna desta semana em
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