São Paulo, segunda-feira, 01 de janeiro de 2001

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VIAGEM LITERÁRIA
Illiers-Combray ganhou nome composto em homenagem ao autor e não mudou muito de 1913 para cá
Casa de Proust e igreja resumem a cidade

DO ENVIADO ESPECIAL A ILLIERS-COMBRAY

O nome original era Illiers. A 25 km de Chartres, no meio do Pays de Loire (a região por onde corre o rio Loire), a cidadezinha adota hoje um nome composto, retribuindo a homenagem impagável do autor de "Combray".
"Vista de longe... da via férrea, quando chegávamos na última semana antes da Páscoa, não era senão uma igreja resumindo a cidade", escreve Proust, que também compara a torre da igreja de Saint-Jacques a um pastor, em torno do qual se agrupam os telhados, como ovelhas, num círculo perfeito que faz pensar em alguma primitiva pintura medieval.
Illiers-Combray não mudou muito de 1913 para cá.
Alguns turistas, agora, provavelmente leitores de Proust, caminham sem pressa pela praça, pelas alamedas e pelos jardins que se espalham para além do perímetro modesto de casas.
No mais, conservam-se o silêncio e a calma da cidade de província, à sombra quase soturna dessa igreja escura e pesada.
O que há em Illiers, então? Há a casa de Proust, espetáculo único nessa paisagem pouco dada ao espetacular. Mas há algo inesperado e maior, que transcende a peregrinação dos proustianos. É um ideal de país, que a própria França hoje só reconhece por exceção.
Uma casa coberta de folhas avermelhadas, o prédio cansado de uma grande escola (Liceu Marcel Proust, naturalmente), um jardim de macieiras: visões como essas acolhem o visitante que vem a pé da estação de trem.
Num domingo, não há viva alma nas ruas, mas nem por um segundo elas parecem desabitadas. A cidade respira, toda ela, humanamente, sem se exibir nem se esconder de quem chega.
Quem vai ao centro terá poucas -mas honestas- opções de abrigo. Três hoteizinhos, três restaurantes (domingo, só um), duas casas de chá. "Onde fica a casa de Proust?" deve ser a pergunta mais ouvida pelos moradores, que nem por isso se cansam de explicar o trajeto. Logo além das casas fica o "pré-catelan", o lindo jardim que serviu de modelo para o caminho de Swann de Proust. Mais além, um horizonte infinito de terra cultivada.
Illiers-Combray não mudou muito. Não vai mudar. Não deve mudar. Quem muda, passando por lá, somos nós.
(ARTHUR NESTROVSKI)



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