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DELÍRIO DE PEDRO
São Petersburgo foi erguida sob perda de 150 mil vidas
Os ossos dos mortos, misturados ao cimento dos monumentos, passaram a fazer parte da mitologia local
DO ENVIADO ESPECIAL
A SÃO PETERSBURGO
A fundação da cidade, em
1703, é o produto da vontade de
um homem. Duas razões moveram o czar Pedro, o Grande: defender a saída para o mar Báltico, região disputada há séculos
com os suecos, e modernizar o
país, construindo uma espécie
de "janela para o Ocidente".
O czar, desde cedo apaixonado pela indústria naval, havia
feito uma grande viagem pela
Europa, a chamada "grande
embaixada de 1697", chegando
a trabalhar nos estaleiros da
Holanda para aprender a arte
da construção de navios. Voltou obcecado com a idéia de
ocidentalização da Rússia, para
a revolta da igreja de Moscou.
Aproveitando uma trégua
com os suecos, o czar lançou as
fundações de sua cidade numa
ilha do rio Neva, que viria a se
transformar na fortaleza de Pedro e de Paulo.
Os sacrifícios humanos foram numerosos. Cerca de 150
mil trabalhadores perderam a
vida durante os primeiros três
anos da construção da cidade.
Os ossos dos mortos misturados ao cimento dos monumentos passaram a fazer parte da
mitologia local.
Insustentável
Mas São Petersburgo floresceu em grande velocidade.
Cientistas, engenheiros, juristas, teóricos e economistas foram incentivados a viver por lá.
Em cem anos, a cidade já era
maior que Moscou e se tornou
o símbolo de uma nova Rússia.
Durante o reinado de Catarina, a Grande, a cidade foi ampliada e embelezada. Severos
planos urbanísticos foram impostos: as fachadas deveriam
ter padrão europeu e proporção harmônica com as ruas. Foram construídos o palácio de
Inverno, hoje museu Hermitage, e o monumento a Pedro, o
Grande, dois marcos.
Mas a grande ironia da história da cidade ainda viria. Ao
abrir a janela para o Ocidente, o
czar trouxe também as idéias liberais e de modernização que
não condiziam com o regime
autoritário da própria Rússia.
Em 1814, os soldados que empurraram Napoleão de volta à
França tiveram contato com as
aristocracias, os parlamentos e
as monarquias constitucionais
da Europa ocidental.
Em meados do século 19, entre os cafés e as vitrines da avenida Névski começaram a circular as primeiras idéias vindas
do oeste. Diversas manifestações por reformas constitucionais foram esmagadas pelo regime autoritário dos czares.
Não tardou muito para a situação ficar insustentável. Em
9 de janeiro de 1905, o "domingo sangrento", 150 mil grevistas
e operários foram à praça do
Palácio pedir melhorias e foram recebidos a bala pelos soldados de Nicolau 2º.
A Primeira Guerra Mundial
trouxe ainda mais dificuldade.
No meio da turbulência, Nicolau mudou o nome da cidade
para Petrogrado, termo mais
eslavo, num ato simbólico para
conter a ocidentalização. Mas
era tarde demais.
Após a abdicação do czar, entre os diversos grupos que disputavam o poder, os bolcheviques saíram vitoriosos. Em
abril de 1917, vindo do exílio,
Lênin desembarcava na estação Finlândia para mudar o rumo da história.
A exposição aos inimigos fez
o novo governo mover a capital
de volta para Moscou, e a cidade entrou em declínio. Após a
morte de Lênin, foi rebatizada
Leningrado.
Durante a Segunda Guerra
Mundial, a população deu provas de coragem. Por quase 900
dias a cidade resistiu ao exército nazista durante o chamado
"cerco do Leningrado", com toda a sorte de sacrifícios.
Leningrado permaneceu
ofuscada pela importância de
Moscou durante a segunda metade do século 20, até ser redescoberta pelos turistas estrangeiros depois do fim da União
Soviética.
Num plebiscito em 1991, a
população devolveu-lhe o nome de São Petersburgo.
(TUCA VIEIRA)
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