São Paulo, segunda, 6 de abril de 1998

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QUALQUER VIAGEM
Um limpador de língua acompanha esse vinho caro

DAVID DREW ZINGG
em Sampa

"O custo de vida subiu mais um dólar o litro." W.C. Fields

O velho e destemido repórter Dave acaba de descobrir em Nova York um método à prova de erros para você tomar uma garrafa inteira de um vinho francês extraordinário e ainda economizar um ano de salário.
Quando estive recentemente na velha Gotham City, tive a oportunidade de passar os olhos numa sondagem que será divulgada em breve pelo pessoal da Zagat.
Trata-se daquele pessoal que publica as famosas pesquisas Zagat sobre o custo e a qualidade dos melhores restaurantes e hotéis da Gringolândia.
A nova sondagem, que mostra o custo do vinho em 64 restaurantes de alta classe em Manhattan, demonstra, de maneira dramática, até que ponto a maioria dos proprietários de restaurantes é formada por ladrões sem escrúpulos.
Em primeiro lugar, Joãozinho, para ganhar dinheiro, é preciso ter dinheiro, certo? Certo. Eis o que fazer para poupar muito "moolah" e, ao mesmo tempo, ficar alto de verdade. Você NÃO deve levar sua Jennifer de plantão para East 55th Street para tomar uma garrafa do excepcional Bordeaux Chateau Petrus, safra 1982, no elegante restaurante Lespinasse, no exclusivo St. Regis Hotel, em Nova York.
O restaurante oferece essa obra-prima líquida francesa, exclusiva e difícil de encontrar, por um preço convidativo: meros US$ 5.000 a garrafa.
Agora entra a estratégia do tio Dave para você ganhar dinheiro. Desça com sua garota pela mesma rua, atravesse a Quinta Avenida apenas meia quadra em direção a West 55th Street até chegar a um restaurante muito agradável de nome Michael's. Ali o sommelier serve a mesma garrafa de Petrus 82 por meros US$ 1.000!
Com os US$ 4.000 que você economizou, depois de enviar US$ 400 (10%) a seu agente Dave, aquele em quem você confia cegamente, você ainda terá US$ 3.600 para gastar como quiser na Big Apple.
É claro que há uma lógica por trás da enorme disparidade entre os preços de vinho em diferentes estabelecimentos.
A Chateau Petrus, por exemplo, produz menos de 4.000 caixas de vinho por ano. Dez anos mais tarde, quando o vinho está maduro, é quase impossível encontrá-lo.
Um restaurante que tivesse adquirido o Petrus safra 1982 em 1983 poderia vender o vinho a um preço muito inferior ao oferecido por outro que tivesse comprado o mesmo vinho no ano passado.
Os restaurantes chiques, como o Lespinasse ou o Le Cirque 2000, têm clientes "lista A" que querem ver os rótulos mais famosos do mundo nas garrafas das quais sai o vinho que bebem. Também possuem carteiras "lista A" capazes de arcar com os preços astronômicos.
Esses vinhos são consumidos por gênios de Wall Street, estrelas de cinema, músicos de rock e gente dessa laia.
Pessoas de verdade, como eu e você, vão a outros lugares atrás de substitutos mais baratos e de qualidade quase igual.
Dois dos meus lugares prediletos para tomar vinho a preços razoáveis são o "steak joint" Sparks, em East 46th Street, normalmente frequentado por mafiosos de bom gosto, e (curiosamente) o recém-reaberto The Oyster Bar, na Grand Central Station.
Pare de cheirar os ombros de sua Jennifer, Joãozinho, e preste atenção à última dica do mercador de vinhos Dave.
O nome do lugar é Harry's e fica na praça Hanover. É conhecido principalmente entre banqueiros nova-iorquinos que adoram vinho -um grupo célebre por sua capacidade de espremer a última gota de valor de cada dólar.
Segundo a sondagem da Zagat, o Harry's oferecia vinho aos melhores preços da cidade. O Harry's tinha 62 dos menores preços registrados e nenhum dos mais altos.
Um exemplo: um Jordan Cabernet Sauvignon ano 1984 custa US$ 55 ali, contra US$ 175 no The Park Avenue Cafe. O Cheval Blanc 1982 sai por US$ 795 no Harry's, contra US$ 2.600 no Le Cirque. A lista do Harry's abrange 586 vinhos.
Por falar nisso, Harry existe. Trata-se de Harry Poulakakos, o simpático proprietário grego que se mantém sempre atento para defender os interesses líquidos de seus fregueses.
Seu segredo é amplamente conhecido. Harry compra em grande quantidade e conserva suas margens de lucro no nível mínimo possível.
De modo geral, o velho saca-rolhas Dave recomenda que você evite os restaurantes mais caros, onde um vinho de baixo preço é tão fácil de conseguir quanto uma reserva.
Infelizmente, a culpa pelos preços pavorosos dos vinhos em Manhattan deve ser atribuída em doses iguais a Bill "Zipergate" Clinton e Fernandinho "Brasil em Ação" Cardoso. Cada país tem o milagre econômico que merece.
Bill Gates
E agora, uma notícia que acaba de chegar quentinha da Internet: ENCONTRADO BILL GATES DEPOIS DE PASSAR SEIS SEMANAS PERDIDO EM SUA PRÓPRIA CASA.
O gazilionário Bill Gates, 43, foi encontrado ontem no quarto de hóspedes de um dos apartamentos de sua casa de 40 mil pés quadrados em Seattle, jogando uma versão mural de Tetrus (o jogo, não o vinho).
"Levou pelo menos três semanas para darmos pela falta dele", disse sua esposa, Melinda, "e, felizmente, Bill não estava andando por aí -se estivesse, jamais o teríamos encontrado. Ele se lembrou da primeira regra de sobrevivência em casas hightech enormes: 'Fique onde está até o socorro chegar'".

Tradução de Clara Allain



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