São Paulo, quinta-feira, 06 de agosto de 2009

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MIAMI 2 EM 1/ KEY BISCAYNE E SoBe

Chileno desvela o mundo atrás do vinho

Na ilha com parque preservado, isolamento não deu as costas para conforto dos turistas

DO ENVIADO ESPECIAL A MIAMI

O chileno Jorge Mendoza, 41, é um viajante experimentado. E seu destino, sempre, é o "mundo do vinho", já que ele conhece como poucos os vinhedos e as casas produtoras da Europa e das Américas do Sul e do Norte.
Sommelier do resort Ritz-Carlton Key Biscayne, radicado em Miami desde 1989, ele nasceu em Viña del Mar -e guarda na bagagem cultural as lembranças ligadas à boa mesa que herdou da avó, "uma exímia cozinheira que fazia questão de usar peixes, moluscos e ostras recém-colhidos que, de imediato, viravam banquetes".
Veja alguns trechos de sua entrevista à Folha. (SILVIO CIOFFI)

 

FOLHA - Como e quando o sr. decidiu viver e trabalhar na Flórida?
MENDOZA -
Vim estudar hotelaria e administração de hotéis. Fiz a Universidade Internacional da Flórida até 1992 e trabalhei na rede de hotéis Marriott em diferentes posições, sempre em Miami. No ano 2000 comecei o mestrado em hotelaria e passei a trabalhar no Ritz-Carlton Key Biscayne logo que ele abriu, em 2001. Essa escola é uma das mais conceituadas nos -eu podia ter escolhido as universidades de Cornell ou de Nevada, mas preferi a praia de Miami ao deserto em Nevada e à neve em Nova York.

FOLHA - Como a enologia tirou o sr. da administração hoteleira?
MENDOZA -
Sempre me passou pelo coração estar na área de alimentos e bebidas, desde menino. Minha avô materna cozinhava muito bem e eu ia com ela fazer as compras. Lembro dos odores do mercado, das frutas, das verduras. Em casa, criávamos nossos próprios frangos e marrecos. Em 1985, quando comecei na Escola Nacional de Hotelaria, no Chile, me interessei pelo vinho e, com a enologia, aprendi analisá-lo.

FOLHA - Parte de sua educação foi no Chile, onde há vinhos...
MENDOZA -
No Chile ele existe desde a conquista. Era um vinho sacramental, produzido pelos jesuítas, bem diferente do vinho chileno de hoje. Hoje existem as novas tecnologias, o aço inoxidável para fermentar, as novas varietais [tipos de uvas], os barris de carvalho novos vindos da França ou da América do Norte...

FOLHA - Quais eram as varietais até os anos 70? E quais vieram depois?
MENDOZA -
Era a cabernet sauvignon, mas mesclada com outras uvas, como a merlot. Os espanhóis, como disse, levaram o vinho ao Chile. Mas em 1800 teve início a influência francesa. Depois de 1970, com as mesmas uvas, a vinificação mudou, teve início a fermentação em aço inoxidável, a temperatura passou a ser controlada.

FOLHA - Como você trabalha a harmonização entre vinhos e comidas?
MENDOZA -
Para o sommelier é importante ter paixão pela comida e pelos ingredientes, saber os métodos de cozimento e qual será o produto final, educar o paladar. Para complementar a comida com a bebida existem duas formas: por contraste e por assimilação. O vinho não pode ser maior do que a comida -e vice-versa! Se há molho forte, o vinho precisa ser robusto. No contraste, um risoto, que é um prato salgado, pode ser acompanhado por um vinho mais frutado, já que a sensação de açúcar vai contrastar com o sal. Aqui nesse restaurante a cozinha é italiana e a Itália é um país que os gregos chamavam de Enotria, ou terra do vinho. Ali existem 20 mil tipos de uva de cepas diferentes.

FOLHA - E os "supertoscanos'?
MENDOZA -
Gosto muito de Poggio Verano e La Maremma, de um dos herdeiros do consórcio Bolla, no Vêneto. Bolgheri, Sacicaia, Brancaia. Em Verona, Massi é um dos meus favoritos.

FOLHA - O que o sr. diz do panorama chileno, da redescoberta arqueológica do carménère?
MENDOZA -
Estão saindo carménères de muito boa qualidade. Há um ano, não se encontrava o ajuste. Eram tons muito verdes, taninos verdes, fora de balanço. Isso é novo.

FOLHA - E os produtores?
MENDOZA -
Montes, Casa Silva. No Chile há zonas novas. San Antonio, perto de Casablanca, ao sul de Santiago, era uma zona florestal, não uma área vitivinícola. Lá estão nascendo vinhos de influência marítima. Descobriram um microclima benéfico para a cepa e estão saindo vinhos extraordinários. Entre os produtores destaco Viña Quintay e Casa Marin.

FOLHA - Mendoza, a 300 km de Santiago e 1.000 km de Buenos Aires, não tem a ver com o Chile?
MENDOZA -
Digo aos meus amigos de Mendoza que eles são chilenos (rindo). Estão mais perto de Viña del Mar do que de Mar del Plata. Mas as vinhas e a altitude são diferentes. Na Argentina têm alguma precipitação, mas é uma zona seca. Uma agricultura que se beneficia de um grande período de maturação das uvas, e isso dá complexidade. Mas é preciso avançar.

FOLHA - E os lusos e espanhóis?
MENDOZA -
Acredito que o vinho português terá grande representação no mercado, pois têm qualidade. E são diferentes, usam cepas diferentes. Entre os espanhóis, gosto de tempranillo, la rioja, vinhos de Castilla. Também a Espanha se beneficiou da tecnologia, tem mais controle de fermentação e todo mundo faz vinho no país. Estão tendo bons resultados com o clima, têm a tradição -e têm a paixão. Eles fazem vinho para eles beberem. Vendem o que sobra (rindo). Gosto dos tintos, dos brancos da Galícia e sou apaixonado por jerez.


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