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MIAMI 2 EM 1/ KEY BISCAYNE E SoBe
Chileno desvela o mundo atrás do vinho
Na ilha com parque preservado, isolamento não deu as costas para conforto dos turistas
DO ENVIADO ESPECIAL A MIAMI
O chileno Jorge Mendoza, 41,
é um viajante experimentado.
E seu destino, sempre, é o
"mundo do vinho", já que ele
conhece como poucos os vinhedos e as casas produtoras da
Europa e das Américas do Sul e
do Norte.
Sommelier do resort Ritz-Carlton Key Biscayne, radicado
em Miami desde 1989, ele nasceu em Viña del Mar -e guarda
na bagagem cultural as lembranças ligadas à boa mesa que
herdou da avó, "uma exímia cozinheira que fazia questão de
usar peixes, moluscos e ostras
recém-colhidos que, de imediato, viravam banquetes".
Veja alguns trechos de sua
entrevista à Folha.
(SILVIO CIOFFI)
FOLHA - Como e quando o sr. decidiu viver e trabalhar na Flórida?
MENDOZA - Vim estudar hotelaria e administração de hotéis.
Fiz a Universidade Internacional da Flórida até 1992 e trabalhei na rede de hotéis Marriott
em diferentes posições, sempre
em Miami. No ano 2000 comecei o mestrado em hotelaria e
passei a trabalhar no Ritz-Carlton Key Biscayne logo que ele
abriu, em 2001. Essa escola é
uma das mais conceituadas nos
-eu podia ter escolhido as universidades de Cornell ou de Nevada, mas preferi a praia de
Miami ao deserto em Nevada e
à neve em Nova York.
FOLHA - Como a enologia tirou o sr.
da administração hoteleira?
MENDOZA - Sempre me passou
pelo coração estar na área de
alimentos e bebidas, desde menino. Minha avô materna cozinhava muito bem e eu ia com
ela fazer as compras. Lembro
dos odores do mercado, das
frutas, das verduras. Em casa,
criávamos nossos próprios
frangos e marrecos. Em 1985,
quando comecei na Escola Nacional de Hotelaria, no Chile,
me interessei pelo vinho e, com
a enologia, aprendi analisá-lo.
FOLHA - Parte de sua educação foi
no Chile, onde há vinhos...
MENDOZA - No Chile ele existe
desde a conquista. Era um vinho sacramental, produzido
pelos jesuítas, bem diferente do
vinho chileno de hoje. Hoje
existem as novas tecnologias, o
aço inoxidável para fermentar,
as novas varietais [tipos de
uvas], os barris de carvalho novos vindos da França ou da
América do Norte...
FOLHA - Quais eram as varietais até
os anos 70? E quais vieram depois?
MENDOZA - Era a cabernet sauvignon, mas mesclada com outras uvas, como a merlot. Os espanhóis, como disse, levaram o
vinho ao Chile. Mas em 1800
teve início a influência francesa. Depois de 1970, com as mesmas uvas, a vinificação mudou,
teve início a fermentação em
aço inoxidável, a temperatura
passou a ser controlada.
FOLHA - Como você trabalha a harmonização entre vinhos e comidas?
MENDOZA - Para o sommelier é
importante ter paixão pela comida e pelos ingredientes, saber os métodos de cozimento e
qual será o produto final, educar o paladar. Para complementar a comida com a bebida
existem duas formas: por contraste e por assimilação. O vinho não pode ser maior do que
a comida -e vice-versa! Se há
molho forte, o vinho precisa ser
robusto. No contraste, um risoto, que é um prato salgado, pode ser acompanhado por um vinho mais frutado, já que a sensação de açúcar vai contrastar
com o sal. Aqui nesse restaurante a cozinha é italiana e a
Itália é um país que os gregos
chamavam de Enotria, ou terra
do vinho. Ali existem 20 mil tipos de uva de cepas diferentes.
FOLHA - E os "supertoscanos'?
MENDOZA - Gosto muito de Poggio Verano e La Maremma, de
um dos herdeiros do consórcio
Bolla, no Vêneto. Bolgheri, Sacicaia, Brancaia. Em Verona,
Massi é um dos meus favoritos.
FOLHA - O que o sr. diz do panorama chileno, da redescoberta arqueológica do carménère?
MENDOZA - Estão saindo carménères de muito boa qualidade. Há um ano, não se encontrava o ajuste. Eram tons muito
verdes, taninos verdes, fora de
balanço. Isso é novo.
FOLHA - E os produtores?
MENDOZA - Montes, Casa Silva.
No Chile há zonas novas. San
Antonio, perto de Casablanca,
ao sul de Santiago, era uma zona florestal, não uma área vitivinícola. Lá estão nascendo vinhos de influência marítima.
Descobriram um microclima
benéfico para a cepa e estão
saindo vinhos extraordinários.
Entre os produtores destaco
Viña Quintay e Casa Marin.
FOLHA - Mendoza, a 300 km de
Santiago e 1.000 km de Buenos Aires, não tem a ver com o Chile?
MENDOZA - Digo aos meus amigos de Mendoza que eles são
chilenos (rindo). Estão mais
perto de Viña del Mar do que de
Mar del Plata. Mas as vinhas e a
altitude são diferentes. Na Argentina têm alguma precipitação, mas é uma zona seca. Uma
agricultura que se beneficia de
um grande período de maturação das uvas, e isso dá complexidade. Mas é preciso avançar.
FOLHA - E os lusos e espanhóis?
MENDOZA - Acredito que o vinho português terá grande representação no mercado, pois
têm qualidade. E são diferentes, usam cepas diferentes. Entre os espanhóis, gosto de tempranillo, la rioja, vinhos de Castilla. Também a Espanha se beneficiou da tecnologia, tem
mais controle de fermentação e
todo mundo faz vinho no país.
Estão tendo bons resultados
com o clima, têm a tradição -e
têm a paixão. Eles fazem vinho
para eles beberem. Vendem o
que sobra (rindo). Gosto dos
tintos, dos brancos da Galícia e
sou apaixonado por jerez.
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