|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
NUEVOS AIRES
Peça tenta explicar o peronismo por meio da comédia
"El Fulgor Argentino" aborda a história do país apresentando a trajetória de um clube de dança de salão
SYLVIA COLOMBO
DA REPORTAGEM LOCAL
Você sabe o que é o peronismo? Faça essa pergunta a um
argentino e a resposta será positiva, é claro, embora ele não
consiga explicá-lo direito. Logo
começará a fazer divagações
contra o autoritarismo, sobre o
antiamericanismo, o nacionalismo e, em poucos minutos, o
papo já estará longe dali.
Você sairá da conversa sem
uma resposta e com a conclusão de que ser peronista é nada
menos que o requisito básico
para que um governante chegue ao poder na Argentina e dificilmente seja derrubado.
Pois, a política supostamente
nascida com o modo personalista e carismático do presidente e general Juan Domingo Perón (1895-1974), ao lado do tango e de Maradona, talvez seja a
característica mais marcante
da maneira de ser argentino.
Uma visita ao Galpón de Catalinas, na Boca, é um passeio
pela imaginário popular histórico do país e uma tentativa de
explicar o peronismo por meio
de uma comédia.
Espetáculo
Aos sábados, um grupo de vizinhos se reúne em um velho
galpão que faz as vezes de teatro para encenar ali "El Fulgor
Argentino". Nenhum dos participantes é ator profissional, e a
peça conta cem anos da história
do país (1930-2030) por meio
da trajetória de um velho clube
de danças de salão.
Trata-se de uma ficção histórica que se arrisca, ao final,
também a um pouco de futurologia -basta reparar no ano em
que termina a saga.
Tudo começa com o golpe
militar que derruba o governo
de Hipólito Yrigoyen, do tradicional partido de oposição, a
União Cívica Radical, e instala
o primeiro de uma série de golpes militares que vitimaram o
país no século passado.
A tensão popular cresce e freqüentadores do clube se dividem em pró e contra o "establishment".
De um lado, os tradicionais
representantes da elite política
tradicional e a igreja. Do outro,
trabalhadores, imigrantes pobres e despossuídos em geral
que começam a se associar e a
reivindicar seus direitos civis e
posição na sociedade.
Os conflitos se acirram, até
que surge a figura do general
Perón, polarizando interesses.
Na seqüência, vêm as ditaduras, as perseguições a guerrilheiros, as prisões e os desaparecimentos. Até a chegada da
democracia, as crises econômicas, a instabilidade dos presidentes e os dias de hoje, representados numa figura caricata
de Cristina Kirchner, com a cara empapada de pó-de-arroz e
vestida de madame.
Apesar do pesado conteúdo
político, tudo é contado em tom
de galhofa e autocomiseração.
Não se trata de uma análise sociológica, mas sim de como o
povo das ruas viu esses acontecimentos.
Inevitavelmente sai-se dali
com uma visão positiva do peronismo, pois é a que vigora, até
os dias de hoje, nas camadas
mais baixas da sociedade.
Além dos quase 60 atores,
também há bonecos, confeccionados pelos membros do grupo. A direção é de Adhemar
Bianchi-Stella Giaquinto.
O teatro está localizado no
bairro da Boca. Existem outras
encenações ali, mas a mais interessante é mesmo "El Fulgor
Argentino", aos sábados, às
22h, a um preço bem acessível:
25 pesos (R$ 16).
Restaurante
O espaço localiza-se a poucas
quadras do restaurante El
Obrero. Antigamente esta era
uma "parrilla" clássica e sem
luxos. Nos últimos anos, principalmente depois que o diretor
de cinema alemão Wim Wenders visitou o local ao lado do
roqueiro irlandês Bono, do U2,
o local começou a bombar.
Hoje o restaurante segue servindo as carnes tradicionais,
mas já é quase impossível conseguir uma mesa sem marcar
com dias de antecedência.
E, ainda que você consiga, há
o tradicional desconforto em se
perceber comendo num lugar
tão argentino e cercado por
uma maioria de não-argentinos
ao redor. O local virou ponto
turístico obrigatório de vários
guias de viagem.
"As pessoas passam por aqui
e me perguntam: "Onde é o
Obrero?" E eu respondo, o
obrero sou eu!", brinca o rapaz
do grupo Catalinas que improvisa uma "parrilla" na rua mesmo, diante do galpão-teatro
[obrero significa trabalhador,
em espanhol].
Os quitutes vendidos por ele
e seus companheiros nessa tendinha, que fica literalmente na
sarjeta, são, em muitos casos,
bem melhores do que muito do
que se serve no agora arrogante
espaço logo ali ao lado: churrascos, empanadas e que tais -um
cardápio perfeito para se preparar para entrar no túnel do
tempo que é "El Fulgor Argentino".
GALPÓN DE CATALINAS
Rua Pérez Galdós 93, Boca; tel. 00/
xx/54/11/4307-1097. Funcionamento da bilheteria: terça a sábado,
das 17h às 21h
www.catalinasur.com.ar
Texto Anterior: Foco: Concurso para eleger novo "cartão-postal" da cidade em 2010 tem três finalistas Próximo Texto: Pacotes para Buenos Aires Índice
|