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LUZ, DESERTO, AÇÃO!
Para o diretor do longa-metragem "Deus é Brasileiro", local é paraíso que precisa ser preservado
Diegues elege região para encontro divino
DA ENVIADA ESPECIAL AO JALAPÃO
Cacá Diegues, diretor de "Deus
é Brasileiro", que já foi assistido
por mais de 1 milhão de pessoas,
procurava um lugar do Brasil que
fosse quase virgem e, de preferência, pouco conhecido, para a locação das cenas em que Deus (personagem interpretado por Antônio Fagundes) se encontra com
Quinca das Mulas (vivido pelo
ator Bruce Gomlevsky), o candidato a santo procurado por ele.
Depois de ver umas fotos do deserto, ficou deslumbrado com o
lugar, arrumou as malas e foi direto para o Tocantins.
Leia a seguir entrevista exclusiva concedida à Folha pelo cineasta, que retorna à temática do "filme-de-estrada" no seu 16º longa-metragem: Diegues havia explorado em "Bye, Bye, Brasil", filme
de 1979, o tema de um Brasil atropelado pela modernidade urbana.
(SABRINA PETRY)
Folha - Por que o Jalapão? O deserto já era seu conhecido?
Cacá Diegues - Nunca tinha ouvido falar no Jalapão. Aconteceu o
seguinte: eu precisava de um lugar para aquela cena do encontro
de Deus com Quinca das Mulas, o
candidato a santo. E para aquele
encontro, tinha pensado numa
natureza mais ou menos virgem,
ainda intocada pela mão humana.
Eu queria evitar a Amazônia porque lá é muito difícil de filmar, é
um paredão verde que não reflete
luz, além de ser um lugar-comum
para essa idéia.
Eu estava nessa agonia, sem saber para onde iria, quando o cineasta Walter Salles me mostrou
umas fotos da região do Jalapão
tiradas quando ele estava fazendo
pesquisa para o filme "Abril Despedaçado". Quando eu vi as fotos,
fiquei enlouquecido e decidi que
aquele era o lugar. Naquela mesma semana, eu e a Renata Magalhães, que é a produtora do filme e
minha mulher, pegamos um
avião e fomos para lá ver.
Folha - Qual foi sua impressão ao
chegar ao Jalapão?
Diegues - Chegando lá, eu pensei: "É aqui mesmo". Era exatamente aquilo que eu queria como
cenário. Aquele cerrado absolutamente maravilhoso, com muita
fauna e muita flora, um número
inacreditável de rios, de cachoeiras, aquele deserto de areia calcária cercado por um rio e com a
serra do Espírito Santo ao fundo,
o fervedouro... Eu fiquei até triste
porque a maior parte eu não pude
usar, não tinha filme suficiente
para colocar tudo aquilo.
Folha - Como foram os preparativos para rodar "Deus é Brasileiro"?
Diegues - Eu fui às locações
umas quatro vezes antes de começar a filmar "Deus é Brasileiro".
Na primeira vez, não existia nada.
Ficamos hospedados numa fazenda abandonada, onde hoje
funciona uma pousada.
Tinha até morcego. Depois da
primeira vez, comecei a levar a
equipe de produção, o cinegrafista, o fotógrafo, para que eles pudessem ter uma noção de como
seriam as filmagens.
Folha - Como foi filmar no meio
do deserto, um lugar praticamente
sem infra-estrutura?
Diegues - Nós ficamos uns dez
dias filmando. Saíamos de madrugada para conseguir chegar às
locações a tempo de pegar uma
boa luz. Para filmar a cena em que
o tempo passa rapidamente, por
exemplo, foi preciso que uma
equipe formada por um fotógrafo, um assistente e duas pessoas
da produção acampasse em três
diferentes pontos do deserto para
que se captasse o dia e a noite.
Folha - Qual foi a maior dificuldade enfrentada pela equipe de filmagem no Jalapão?
Diegues - A maior dificuldade
era o acesso. Você pode imaginar
como é transportar 32 pessoas
por uma estrada de terra em péssimas condições. E ainda tínhamos os equipamentos de filmagem para serem carregados, porque, em alguns pontos, o acesso
de carro é impossível.
Também tínhamos que montar
barracas para captar o amanhecer
ou para nos proteger das chuvas,
porque começamos a filmar em
outubro -e o período da cheia
começa em novembro. Teve uma
vez que perdemos um dia inteiro
de filmagem e tivemos que ficar
embaixo de uma barraca. Foi uma
corrida contra o tempo, pois em
novembro, com a chegada das
chuvas, ficaria inviável trabalhar.
Apesar das dificuldades, o lugar
é um paraíso e eu torço para que
ele seja preservado, porque aquilo
é fácil de ser destruído, é um sistema ecológico muito frágil.
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