São Paulo, segunda, 8 de junho de 1998

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DRIBLE A COPA
Cidade é como as grandes amantes, se renova a cada noite para nos dar mais alegria e prazer
Paris é uma festa que não acaba nunca

João Bittar/Folha Imagem
Torre Eiffel, em Paris, epicentro do país invadido pelo futebol nesta semana


CARLOS HEITOR CONY
do Conselho Editorial

Desde que os romanos andaram pela Gália, a Lutecia Parisiorum chamava a atenção. Não era uma aldeia, muito menos uma cidade. Era um aglomerado alegre, às margens do Sena, habitado por parisienses. Paris ficou sendo a única cidade do mundo que não deu nome a seus habitantes. Foi o contrário: o nome dos habitantes é que deu nome à cidade.
De lá para cá, a aldeia cresceu em graça e formosura, como as infantas das cortes reais. Paris estava destinada a ser uma princesa, mais tarde rainha. Uma canção da "belle époque", que fez muito sucesso e ainda é tocada todas as noites no Lido, garante que Paris é uma loura, Paris é rainha do mundo ( "Paris c'est une blonde, Paris, reine du monde") .
Loura, rainha, festa e missa -tudo isso formou o imaginário do homem a respeito da capital francesa. Inclusive a missa -aqui se celebram as missas mais bonitas do mundo, com fanfarras colossais na Notre-Dame, bom repertório em espaços de acústica perfeita, o colorido dos vitrais manchando de azul, amarelo e vermelho a nudez de pedras medievais.
Mesmo um agnóstico, um budista, um crente do candomblé ou do bispo Macedo não deve perder uma missa dessas. Não precisa rezar. Há que ver um dos espetáculos mais solenes e bonitos que o dinheiro não pode comprar porque, entre outras coisas, é grátis.
Na outra ponta da corda, quem quiser patifaria, quem curtir o chamado "lado bom" da vida tem ruas inteiras para se distrair. São "sexy shops" sombrios, com luzes violetas e gemidos abafados, há de tudo para todos os gostos, desde a australiana que faz sexo com um canguru até a vedete que numa só sessão fez sexo oral com cinco representantes dos cinco continentes -eu não representava a América do Sul, o que foi uma pena.
A tradição firmou que Paris é a capital da moda, do perfume e da comida. Vamos por partes. Moda por moda, Milão rivaliza. Em matéria de comida, apesar de ser a cidade com maior número de restaurantes, bistrôs, espeluncas e cavernas dedicadas ao prazer da mesa, Lyon é hoje considerada a cidade onde melhor se come no país.
Para quem chega a Paris pela primeira vez, o melhor mesmo é fazer o curso intensivo que as agências bem ou mal providenciam por preços módicos. Louvre, Notre Dame, um giro pela cidade à noite, um jantar no Tour d'Argent (se houver dinheiro), um espetáculo no já citado Lido ou no Moulin Rouge, e basta.
Depois sim.O visitante viu o que todo mundo vê e precisa ver, mas ainda está tão longe de Paris como da estrela da Ursa Maior. A festa precisa de tempo, ela não é como aquele baile da Gata Borralheira que precisou acabar à meia-noite. Na verdade, Paris é uma festa que não acaba. E o melhor dela é quando já se conhece o básico, quando já se sente até mesmo um certo tédio por ela. É então que, como as grandes amantes, ela se renova a cada noite para nos dar mais alegria e prazer.



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