São Paulo, segunda-feira, 12 de agosto de 2002

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AFRO-BAHIA

Segundo Reginaldo Prandi, artistas tornaram Estado uma referência na religião, embora RS tenha mais adeptos

Arte fez da Bahia centro do candomblé

DA ENVIADA ESPECIAL A SALVADOR

O candomblé é o conjunto de várias religiões trazidas por diferentes etnias vindas da África. As que mantiveram suas tradições viraram nações do candomblé, como a nação Queto, formada por negros que vieram da cidade de mesmo nome. "Queto ficava no Benin, próxima à fronteira com a Nigéria", explica Reginaldo Prandi, doutor em sociologia e professor titular do Departamento de Sociologia da USP. Segundo ele, pertencem à nação os terreiros Casa Branca, Ilê Axé Opô Afonjá e Gantois, entre outros.
Prandi é autor de cerca de dez livros sobre candomblé, entre eles "Mitologia dos Orixás", que reúne mitos da religião. As lendas mostram elementos usados nos rituais e contam sobre as origens dos ritos. A compilação dos mitos demorou, entre pesquisa e reunião de conteúdo, cerca de 11 anos para ficar pronta e, durante o processo, Prandi entrevistou mães e pais-de-santo de vários terreiros.
As várias correntes do candomblé apareceram no Brasil no século 19, mas a religião cresceu nos locais com maior adensamento de negros. Essas populações viviam isoladas umas das outras, e, em cada local, uma tradição africana foi lembrada e sofreu influências do lugar.
Há o Tambor de Mina, no Maranhão e no Pará, o Xangô, em Pernambuco, e o Batuque, no Rio Grande do Sul. As correntes ganharam nomes associados à música e à dança, exceto o Xangô, o orixá mais cultuado, pois foi o quarto rei da cidade de Oió, que virou o império de Oió.
"Com a sua expansão, cresceu o culto a Xangô. Quando o império foi destruído, as cidades ficaram sem proteção militar, e os negros foram presos e trazidos para o Brasil. Quando chegaram, traziam a lembrança da proteção de Xangô. Em Pernambuco o culto era tão frequente que a religião foi batizada com o nome do orixá."

Cultura baiana
O candomblé da Bahia ficou mais popular no Brasil e transformou Salvador numa espécie de central da religião. A explicação de Prandi para esse fenômeno remete à construção da identidade do país. "Nos anos 20 e 30, formava-se a idéia do Brasil como nação, unificado, com um povo de três raças. A Bahia era o celeiro da inspiração de artistas e escritores. Assim, na construção da identidade nacional, houve uma popularização da cultura baiana. Dos anos 20 aos anos 50 há uma espécie de consumo nacional pelos cultos locais e então consolida-se essa imagem da Bahia como a central do candomblé."
As referências da religião na cultura do Estado ajudaram a firmar o conceito de que ele abriga grande parte dos adeptos da religião. "Em recente pesquisa que fiz sobre a música brasileira do século 20, percebi que o samba exaltação, que fala das belezas e riquezas do Brasil, quando fala sobre a Bahia, traz muitas referências aos terreiros e aos orixás."
Mas, no Rio Grande do Sul, o candomblé, chamado de Batuque, é muito forte, segundo Prandi, embora o homem da fronteira, o gaúcho, tenha mais força no imaginário popular. Por isso o Batuque não ganhou projeção.
O Rio Grande do Sul é o Estado que tem mais adeptos ao candomblé. Segundo o Censo Demográfico do IBGE de 2000, 1,63% da sua população segue religiões afro-brasileiras, conceito que engloba candomblé e umbanda.
(HELOISA HELENA LUPINACCI)


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