São Paulo, quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

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BOM DIA, TURISMO

"Rezo por menos censura", diz diretor

Jovem cineasta, Di teve curta selecionado pelo Festival de Veneza, mas governo barrou sua participação

MARINA DELLA VALLE
DA REPORTAGEM LOCAL

Exclusividade de estúdios estatais até 2003, o cinema vietnamita vive fase de renovação após surgimento de produções privadas. Apesar da maior liberdade, o governo continua a controlar o que é visto no país por meio da censura.
Um dos nomes de destaque nessa revigoração do cinema do Vietnã -cenário de inúmeros filmes de guerra- é o diretor Phan Dang Di, de 32 anos. Seu curta "Khi Toi 20" (quando eu tiver 20 anos) foi selecionado para o Festival de Veneza em 2008. Di, porém, foi proibido pelo governo vietnamita de levar o filme ao festival.
O Departamento de Cinema Vietnamita permitiu apenas a exibição restrita do curta (no qual um rapaz sabe que sua namorada trabalha como prostituta) sob a alegação de que o filme "vai contra as tradições e costumes" vietnamitas.
O festival decidiu contrariar o governo vietnamita e exibir o curta, utilizando o DVD enviado na fase de seleção. O filme, sem legendas, pode ser visto no link http://homepage.mac.com/tbn1977/.Public/DI/khi%20toi%2020%20104M.mov.
O primeiro longa de Di, "Bi, Don't Be Afraid", cujas filmagens começam em junho, foi selecionado para o programa L'Atelier do Festival de Cannes e recebeu 50 mil do World Cinema Fund do Festival de Berlim em 2008. Leia trechos da entrevista exclusiva que Di concedeu à Folha, por e-mail.

 

FOLHA - Como você vê o episódio do Festival de Veneza?
PHAN DANG DI
- Fiquei um pouco desapontado por não poder ir a Veneza. Qualquer um iria adorar visitar Veneza ao menos uma vez na vida. Ir com meu filme seria ainda mais lindo. De qualquer modo, a chance se foi.
Felizmente ainda sou jovem e cheio de energia para novos projetos. Estou confiante ao afirmar que devo ter outra chance de voar a Veneza um dia, talvez com um longa-metragem. Também rezo para que a questão da censura no Vietnã seja menos restritiva, assim jovens diretores deste país poderão apresentar seus trabalhos "made in Vietnã" pelo mundo.
Embora "Khi Toi 20" não tenha permissão para ser exibido pelo país, ele pode ser visto no centro para assistência e desenvolvimento de jovens talentos do cinema no Vietnã, onde fãs de cinema têm acesso fácil a ele e podem assisti-lo legalmente. Até onde eu sei, o filme foi colocado na internet há cerca de seis meses.

FOLHA - Como é o relacionamento do governo vietnamita com a cena cinematográfica? De que modo esse tipo de interferência ocorre?
DI
- Antes de 2003, os estúdios do Vietnã eram estatais, cineastas recebiam um orçamento do governo para produzir filmes como ordem do Estado. Desde 2003, quando o governo aprovou o estabelecimento de estúdios privados, o mercado ficou mais agitado que nunca. Os cineastas têm mais chances e opções. Mais chances significam mais liberdade para os cineastas, mas isso não significa que eles podem fazer qualquer coisa. O governo ainda tem o controle dos estágios finais: censura antes da ampla exibição.

FOLHA - A Guerra do Vietnã é assunto explorado exaustivamente em filmes dos EUA. Como você vê o modo como o país é retratado?
DI
- Há muitas obras-primas norte-americanas sobre épicos da Guerra do Vietnã, como "Apocalypse Now" (Francis Ford Coppola), "Nascido para Matar" (Stanley Kubrick), "Platoon", "Entre o Céu e a Terra", "Nascido em 4 de Julho" (Oliver Stone). Do ponto de vista de um cineasta, sou atraído por essas visões que transmitem uma linguagem cinematográfica tão impressionante. Para mim, eles significam muito mais que simplesmente assistir como esses cineastas monstraram meu país.

FOLHA - Você pode nos falar um pouco sobre a tradição cinematográfica do Vietnã?
DI
- Os filmes clássicos vietnamitas eram muitas vezes ligados a temas de guerra. Atualmente, embora a guerra não seja mais um tópico quente, eu escolheria "When Will October Come", de Dang Nhat Mihn (1884), como o filme mais representativo. Ele conta a história de uma mulher cujo marido morre na guerra. Com medo de que seu sogro não consiga superar a notícia, ela pede a um professor para escrever cartas em nome de seu marido.

FOLHA - Qual a importância do cinema dentro da cultura vietnamita? Qual o volume de produção, e como é a recepção do público em geral?
DI
- O cinema foi a forma de entretenimento mais popular no Vietnã desde a guerra até os anos 1980. Durante esse tempo, cinemas móveis percorreram o país mostrando filmes vietnamitas, russos, chineses e da Europa Oriental. As coisas mudaram no começo dos anos 1990, a maioria das famílias tem uma TV, que se tornou a principal prioridade. Cerca de 80% dos cinemas fecharam, e houve um tempo em que o Vietnã produzia apenas três filmes por ano.
Em 2003 os estúdios privados começaram a atuar, e o mercado chegou ao ponto decisivo.
Atualmente, cerca de dez filmes são produzidos a cada ano.

FOLHA - Quais locais você recomendaria a um turista no país?
DI
- O Vietnã tem uma longa costa de 1.600 km. A maioria dos resorts está localizado perto da praia, como Phu Quoc, Nha Trang. Halong Bay é reconhecida como um dos locais mais lindos do mundo. Sua imagem apareceu em filmes como "Indochina", de Régis Wargnier, e "As Luzes de um Verão", de Tran Anh Hung. Turistas na região central devem visitar três sítios históricos: Hue, Hoi An e My Son.

FOLHA - E quais experiências você recomenda aos viajantes?
DI
- Explorar a área montanhosa no norte, na fronteira com a China. E descobrir a cozinha vietnamita é um motivo atraente o bastante para comprar as passagens imediatamente.


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