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SACADAS MEXICANAS
Turismo oficial explora regiões além de Cancún, que valorizam passado colonial
Michoacán expressa alma do México
ISRAEL DO VALE
ENVIADO ESPECIAL AO MÉXICO
Sete e pouco da manhã, congestionamento. A sensação inicial de
quem segue de São Paulo para a
Cidade do México é a de que o
avião passou nove horas dando
voltas no ar e pousou no mesmo
lugar. Mas a baldeação é inevitável para quem pretende chegar de
carro à "alma mexicana", como
vem sendo chamado o Estado de
Michoacán, no sudoeste do país.
Não é preciso mais do que dez
minutos pelas avenidas, a partir
do aeroporto internacional, para
o clima de intimidade com os
"hermanos" se estreitar ainda
mais: lavadores de pára-brisas
num farol, garotos com malabares noutro, vendedores ambulantes nos principais cruzamentos.
Ok, há sempre a possibilidade de
refúgio no rádio: "Beso en la boca/
es cosa del passado/ la ola ahora/
es namorar pelado". Por "diós"!
Primeira impressão
Vencido o batismo de fogo, o
conforto real é que essa primeira
impressão, além de parcial e limitada, não é a que fica. Segunda cidade mais populosa do planeta, a
capital mexicana guarda todos os
vícios e vicissitudes do Terceiro
Mundo. (Não à toa um paulistano
se sente em casa.)
Mas, se o caos do trânsito da
metrópole é desalentador, as rotas de fuga para o interior são seu
avesso: bem-cuidadas, sinalizadas, livres do tráfego intenso
-enfim, bastante convidativas,
com belos vales e planícies. (Ah!
Cheias de pedágios também, é
preciso que se diga.)
Localizada na porção sul do longilíneo território mexicano, a capital do país (ou DF, como eles
preferem chamar) se oferece como contraponto ao perfil rural
que domina a maior parte das 31
unidades da federação.
México real
Assim como certo país continental mais ao sul, o México são
vários. É Cancún (e seus sombreros de butique), sim, como muito
turista imagina, mas é também a
insurgente Chiapas ou a reivindicadora Michoacán, palco dos movimentos de independência do
país. E a face indígena mexicana
tem muita história para contar.
É a isso que os departamentos
oficiais de turismo local tratam
por México real -o que não é outra coisa senão um esforço para
ampliar a circulação da "plata"
gringa para além de Cancún.
País latino com a maior população de origem indígena, o México
intensifica a valorização do perfil
étnico de seus habitantes (e a cultura gerada aí) como um atrativo
turístico a mais -para além da
herança arqueológica, por si só de
extremo valor.
A bola da vez é justamente Michoacán. Responsável por três de
cada quatro abacates produzidos
no país do guacamole, o Estado
agora quer colher os frutos do investimento na conservação do patrimônio arqueológico e arquitetônico, do potencial ecológico, do
artesanato e da gastronomia.
O fio da meada, que costura tudo, é a trajetória marcante do
país, alicerçada no ranger de dentes do histórico de lutas - seja
contra a invasão estrangeira (desde o século 16), pela nacionalização do petróleo (em 1938) ou pelos direitos políticos e sociais (cujo ponto recente mais marcante é
o controle de Chiapas pelo Exército Zapatista de Libertação Nacional, de origem indígena, que faz
dez anos em 2004).
A capital michoacana, Morelia,
escancara portas e janelas do passado para o estrangeiro. A três horas da Cidade do México e a outras três do litoral, é um oásis no
preservacionismo da arquitetura
de valor histórico.
Patrimônio conservado
Classificada em 1991 como Patrimônio Cultural da Humanidade, pela Unesco, serve de modo
gritante como exemplo do que a
mineira Ouro Preto, sob ameaça
de cassação de título equivalente,
não soube fazer.
Morelia concentra o que realmente merece ser chamado de
um conjunto arquitetônico harmônico. Seu centro histórico é algo inimaginável de tão ajeitado e
uniforme. (E sem parecer um parque temático.) Resultado do esforço contínuo das diferentes esferas do governo para recuperar
os prédios, cuidar para que novas
construções não destoassem das
antigas, manter ruas e fachadas
limpas e bem iluminadas.
Os edifícios do centro histórico
são limitados a uma altura de três
andares -seis andares, na cidade, é arranha-céu. Tudo para deixar à mostra, do maior número
possível de ângulos, as duas torres
de 67 metros da monumental catedral barroca construída ao longo de 84 anos, a partir de 1660.
Mas esta é só a parte visível. Por
trás de tudo, há um empenho pela
conscientização dos moradores e
da rede de serviços, que se manifesta, por exemplo, por meio de
campanhas de limpeza (bem-sucedidas) ou de um guia como o
"Tesoros", com hotéis e restaurantes submetidos a rígidos critérios de julgamento -o questionário de avaliação para a admissão no clube dos seletos é aplicado
por agentes/clientes incógnitos.
Partida
Morelia é ponto estratégico para
circular pela região. Dista cerca de
45 minutos de um sítio arqueológico como Tzintzuntzan, uma hora de charmosos
povoados com construções dos
séculos 16 e 17 ou menos de duas
horas de áreas de rafting, num cenário de bosques e montanhas, e
de um parque nacional como o
Eduardo Ruiz, no perímetro urbano de Uruapan.
Num passeio matinal, pode-se
esticar até uma cidade como Santa Clara del Cobre, forjada em torno da manufatura de objetos variados feitos no metal que lhe empresta o sobrenome; com pouco
mais de tempo, enveredar pelo intrigante cenário "de fim de mundo" da região tomada no século
passado pela lava de um vulcão
-que, caprichosamente, manteve intacto o altar de uma grande
igreja, cuja torre se avista no horizonte, no meio do nada.
Michoacán é, afinal, uma privilegiada conexão com um passado
de batalhas -com a natureza,
com a especulação imobiliária ou
com o conquistador espanhol.
Israel do Vale viajou a convite da AeroMexico e da Secretaria de Turismo de Michoacán
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