|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
A 89 KM DE SP
Soldado trouxe aprendizado da iguaria após lutar na Segunda Guerra e começou a produzi-la artesanalmente
Genuína lingüiça bragantina traz receita italiana
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA,
EM BRAGANÇA PAULISTA (SP)
Que Bragança Paulista é a
terra da lingüiça quase todo
mundo sabe. O que confunde
muita gente, inclusive os moradores, é a grande quantidade de
placas informando que ali se
vende, sim, a legítima lingüiça
bragantina. Aquela com tradição de mais de 55 anos. Mas,
afinal de contas, onde é possível
comprar a verdadeira?
De certo modo, a maioria
dessas placas está dizendo a
verdade. Muitas casas vendem
a lingüiça produzida em Bragança, e várias usam a receita
que por ali aportou nos anos
40. Ela foi trazida da Itália pelo
então soldado Octavio Pereira
Lente, que fora à Europa lutar
na Segunda Guerra Mundial.
Lente começou a produzir a
lingüiça artesanalmente no bar
do Rosário, que na época pertencia ao seu pai. A iguaria fez
tanto sucesso que ele precisou
da ajuda da família toda para
dar conta do recado: a mulher,
Mariquita, o irmão Sebastião, a
cunhada Anazir. Esta última só
colocou a mão na massa, quer
dizer, na lingüiça, em 1958,
quando se casou com Sebastião. "Lembro que o bar ficava
lotado de gente perto das 14h,
15h, horário em que os ônibus
chegavam ao ponto, ali perto."
A família vendeu o bar nos
anos 60. E Sebastião continuou
produzindo lingüiças em casa
até 2005, quando adoeceu. Viúva há cerca de quatro meses,
Anazir diz que hoje não tem
mais coragem de comprar lingüiça por aí. "Tião só fazia calabresa com pernil de primeira e
tripa de carneiro importada, o
que era muito caro. Quando vejo hoje o preço da lingüiça nos
supermercados e nos açougues,
me pergunto o que eles colocam lá dentro." Ela lembra que,
nos últimos tempos, Sebastião
era o único a cortar o pernil na
faca, processo hoje substituído
por moedores de carne. "Ele separava todos os nozinhos com
as próprias mãos."
Anazir diz sentir muitas saudades de um bom sanduíche de
calabresa com queijo, no pão
francês. E pretende degustar a
iguaria no bar do Rosário, que
nunca deixou de vender a lingüiça preparada com a receita
da família Lente. Desde que o
clã vendeu o ponto, sete pessoas já assumiram o seu comando. E Mariquita, a viúva de
Octavio, ensinou seu segredo a
todas elas. Porém o movimento
não é o mesmo da sua época.
"Hoje, aquela região é mais residencial, e à noite fica meio
morta", justifica Anazir.
Atualmente o Rosário pertence a Dailton Medeiros, um
chef cearense que já passou por
vários restaurantes de São Paulo. Ele diz ter dois sonhos: reerguer o bar, devolvendo-lhe o
prestígio de outrora, e montar
uma casa no bairro paulistano
da Vila Madalena, para lá fazer
caprichados pratos com sua genuína calabresa bragantina
-que, diga-se de passagem,
continua muito boa e valendo a
fama (o sanduíche de calabresa
com queijo e molho vinagrete
custa R$ 3,50, e a porção de lingüiça com cebola, um dos hits
do bar, R$ 9,80).
Dailton comprou o ponto de
Manoel Dantas de Almeida, hoje dono da lanchonete do Rosário, na entrada da cidade. Ao
abrir uma casa em ponto tão
privilegiado, seus negócios
cresceram tanto que ele está
construindo uma nova unidade
do outro lado da rua, com inauguração prevista para o dia 30.
"Vendo duas toneladas de lingüiça por mês", diz.
Embora faça a iguaria com a
receita original do Rosário, como diz a placa na entrada da casa, ele não é mais o dono da
marca. Ali o "cheesecalabresa"
com vinagrete custa R$ 4, e a
calabresa com arroz, feijão, ovo
e salada sai por R$ 6,50.
Outras modas
Além da calabresa bragantina, preparada do mesmo modo
há quase 60 anos, Bragança
vende outras lingüiças de ótimo sabor, embora sem tradição. É o caso da Lingüiçaria
Bragança e do Empório Bragança. Inaugurado em abril, este último vende uma surpreendente calabresa recheada com
provolone, azeitonas chilenas e
ervas (R$ 15,90 o quilo), lingüiça de filé de frango, sem pele
nem gordura (R$ 11 o quilo), e a
tradicional calabresa pura de
pernil (R$ 12,50 o quilo).
Localizado ao lado do bar do
Nikko -um dos points bragantinos de fim de tarde -, o Empório não serve sanduíches
nem porções no local por um
acordo com o vizinho, mas fornece para ele suas iguarias e
funciona na base do "delivery".
Os sanduíches vêm num pão
cuja massa mescla a do pão
francês com a do italiano (o
sanduíche de calabresa com
queijo custa R$ 5). O Empório
Bragança ainda tem produção
própria de outras delícias, como tomate seco (R$ 18 o quilo)
e pão de alho com azeitona (R$
1,50 o pacote de cem gramas).
(MARISTELA DO VALLE E FABRÍCIA FURUZAVA)
ONDE COMER - bar do Rosário: r.
Barão de Juqueri, 6; tel. 0/xx/11/
4034-3748; lanchonete do Rosário:
av. D. Pedro, 1.430, tel. 0/xx/11/
4032-8190; Empório Bragança: r.
Conselheiro Rodrigues Alves, 155;
tel. 0/xx/11/4033-4789; Lingüiçaria Bragança: praça 9 de Julho, 30,
tel. 0/xx/11/4033-2226.
Texto Anterior: Picos divertem de cima para baixo e vice-versa Próximo Texto: Culinária farta atende ao paladar paulistano Índice
|