|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
BRASIL DANÇA
Nos arraiais, coreografia e canções são apresentadas por casais, caixeiros e criadora do sensual remelexo de roda
Dona Teté assanha trupe com cacuriá
DO ENVIADO ESPECIAL A SÃO LUÍS
"Uma gostosura dos diabos",
brinca Almerice da Silva Santos,
79, a dona Teté do Cacuriá. No
centro histórico de São Luís, ela e
a trupe de belas moças e rapazes
requebram para os fotógrafos. "É
rebolado, sim, só que vem do Divino", corrige dona Teté, apelidada assim por um padre.
Fala com conhecimento de causa: ela também é rezadeira, tocadora de caixa (espécie de zabumba) e cantora de ladainhas na festa
do Divino Espírito Santo, em São
Luís, onde nasceu.
A sensualidade das coreografias
(mãos nas cadeiras e muito rebolado), as composições de duplo
sentido ("Jabuti sabe ler, não sabe
escrever/Ele trepa no pau e não
sabe descer") e principalmente o
carisma de Teté caíram nas graças
do povo. Aqui, porém, a erotização não é ostensiva.
Além de ensaiar as coreografias
e decorar as canções, os 13 casais,
seis caixeiros e três músicos (violão, flauta e cavaquinho ou banjo)
precisam emanar o sorriso largo
tal qual a caixeira Teté.
"Aonde o cacuriá chega ele contagia as pessoas", orgulha-se a
mulher que incrementou a dança
de roda aprendida com o colega
Lauro de Almeida, um estivador
dado à criação de pastoris (folguedos) e turmas de samba.
No início dos anos 70, dona Zelinda Lima, uma pesquisadora de
cultura popular, pediu para seu
Lauro inventar uma nova dança:
o cacuriá, derivação do carimbó
das caixeiras, acompanhamento
tradicional para a derrubada do
tronco de árvore que vira mastro
para a festa do Divino.
"O Lauro, com quem trabalhei
por nove anos, era muito puritano. As mulheres trajavam vestidos de senhora. Aí eu apimentei o
cacuriá. Ficou uma dança menos
religiosa e mais "reboculosa'",
despacha Teté.
Convidada a ensinar o toque
das caixas às jovens que frequentavam o Laborarte, em meados
dos anos 70, Teté introduz as mudanças que deixaram o cacuriá
com a marca da lascívia e da diversão. Seu Lauro, que já morreu,
e outros artistas mais conservadores chegaram a protestar, em vão,
contra a "escandalosa dança".
Hoje, o cacuriá de dona Teté vai
além do Divino e atravessa as festas juninas com desenvoltura. É
uma performance que cabe em
qualquer calendário da cultura
popular.
Atualmente, há outros 40 grupos de cacuriá em São Luís, prova
do talento dessa mulher vaidosa e
graciosa, que nunca se casou, mas
criou uma filha e ganhou netos.
Ela lançou um CD ("Cacuriá de
Dona Teté", selo Laborarte) e acaba de gravar o segundo, que deve
sair em breve.
Três anos atrás, fez participação
especial no espetáculo "Mãe Gentil", do coreógrafo Ivaldo Bertazzo, que passou por São Paulo e pelo Rio. Estava ao lado dos conterrâneos Zeca Baleiro (leia na pág.
F5) e da cantora Rosa Reis, parceira nas coreografias do cacuriá
com o pesquisador Nelson Santos
de Brito.(VALMIR SANTOS)
Texto Anterior: Pacotes Próximo Texto: Seu Tonico receita catuaba e cachaça Índice
|