São Paulo, quinta-feira, 26 de julho de 2007

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SEM RUMO

"Congonhas não deve ser satanizado", diz especialista

Editor de revista sobre aviação lembra que nem mesmo acessos rápidos a Guarulhos foram construídos

SILVIO CIOFFI
Editor de Turismo

Para o jornalista Valtécio Alencar, 35, "o aeroporto de Congonhas não deve ser satanizado". Editor da revista "Aero Magazine", ele admite, no entanto, que logo após um acidente como o que ocorreu com o Airbus da TAM, "é natural esperar esse tipo de reação."
"É preciso esperar e analisar se as medidas anunciadas são eficientes e possíveis", diz Alencar. "Surgirão sugestões razoáveis e insensatas -e só com a cabeça fria será possível discernir entre elas". Leia a seguir sua entrevista à Folha:

 

Congonhas
"O país perde muito com o caos aéreo. Houve uma popularização do transporte aéreo, muitos brasileiros estavam voando pela primeira vez. Pela imprevidência e pela falta de política desse governo e de governos anteriores, vivemos agora essa situação. E o fechamento de um aeroporto como o de Congonhas acaba causando reflexos em toda a malha aeroviária brasileira. Do ponto de vista da infra-estrutura, São Paulo -que sempre foi um pólo industrial, econômico, financeiro e até de turismo- está sofrendo com essa falta de atenção governamental. E não é só o caso de Congonhas: Campinas e Guarulhos não estão preparados para receber a demanda extra com a interdição parcial ou total [de Congonhas]. Também não existem acessos rápidos e eficientes para Guarulhos e Campinas, algo perfeitamente executável. A rodovia dos Bandeirantes tem canteiros que previam um trem rápido, mas o governo de São Paulo também não fez a lição de casa."

Autoridades
"Outras autoridades que, parece, não fizeram a lição foram a Anac e a Infraero. Durante muito tempo, principalmente a Anac, que tem um receita bilionária -arrecadou R$ 1,5 bilhão no ano passado-, investiu só parte dessa verba nos aeroportos. E, do montante investido, muito pouco foi para a área operacional. As áreas comerciais receberam mais atenção. Estamos vivendo uma espécie de colapso: a demanda para os próximos anos é grande, e o próximo aeroporto, para não nascer saturado, lá por 2012, precisará de uma capacidade mínima para 70 milhões de passageiros por ano. Guarulhos, hoje, comporta anualmente apenas 15 milhões."

Acidentes
"Um acidente como o do Airbus da TAM, na semana passada, deixa uma grande marca negativa para quem vive do transporte aéreo; aliás, é doloroso para todo mundo. E há relatos de que, depois das obras, a pista está ainda mais escorregadia.
Não posso afirmar categoricamente, mas parece que até o acidente do Boeing da Gol com o Legacy, há dez meses, a aviação comercial brasileira, mesmo com problemas de infra-estrutura e gargalos, funcionava bem. Panes como a do Cindacta-4, ocorrido na noite de sexta para sábado, arranham ainda mais a imagem internacional do país. Sem dúvida, depois que a Polícia Federal e a Justiça resolveram intervir na investigação aeronáutica do vôo da Gol, transformando as provas em provas criminais, os controladores, diretamente envolvidos na questão, se sentiram pressionados, politizando a crise, iniciando procedimentos como a operação padrão."

Estradas
"O turista que tem a opção de sair do avião e ir para o ônibus também está encontrando dificuldade, pois esse reflexo já está começando a saturar a estrutura rodoviária, que também não é a melhor do mundo. Não sei se o turismo rodoviário "vai ganhar" com a crise aérea. Mas o setor da aviação, que vinha crescendo a níveis exponenciais no Brasil, perde, e perde muito. Em Congonhas, houve uma freada, as operações estão sendo revistas e acontecem deslocamentos. Essas adaptações, feitas sem grandes planejamentos prévios, certamente vão prejudicar o país."

Apuração
"O governo federal não tem olhado com atenção, há anos, o setor aéreo. O governo FHC -que propôs em 1998 a criação da Anac, Agência Nacional da Aviação Civil, para substituir um órgão militar, o DAC, conduziu mal o processo, que tramitou no Congresso Nacional até 2005. Durante sete anos, o governo federal deixou os investimentos para o setor estagnados e houve um desestímulo tremendo para os funcionários do DAC, que ficaram num departamento fadado a morrer, à míngua de informações.
A Anac foi criada às pressas, copiou o modelo de agências estrangeiras com a FAA (Federal Aviation Association dos EUA) e a EASA (European Aviation and Safety Authority), mas suas diretorias, que deveriam ser preenchidas por técnicos, foram ocupadas por indicações políticas."


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