|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
VENEZA EM LETRAS
Se guia, Jan Morris seria jogada na água
Autora de um dos principais livros sobre a cidade, escritora inglesa sabe até hora em que ela foi fundada
DO ENVIADO ESPECIAL A VENEZA
Se fosse guia em Veneza, Jan
Morris seria seguida por centenas de turistas. Ou jogada no
Grande Canal, porque não pararia de falar. Jan Morris deve
ser a única pessoa que sabe que
Veneza foi fundada em 25 de
março de 421 -ao meio-dia.
Inglesa historiadora e escritora de livros de viagem, ela
nasceu homem (assinava James Morris) e trocou de sexo
na década de 70 (hoje é uma velhinha de cabelos algodoados).
Publicou mais de 30 títulos, sobre lugares como Hong Kong,
Inglaterra e África do Sul.
Veneza é uma obsessão sua.
"Venice", publicado em 1960 e
revisado três vezes, é um dos livros mais caudalosos já escritos
sobre a cidade italiana.
Sim, os turistas a seguiriam
emocionados ou a jogariam para fora do vaporetto. "Veneza
era um lugar de seda, esmeraldas, mármores, brocados, veludos, tecido de ouro, marfim,
temperos, perfumes, macacos,
ébano, anil, escravos, grandes
galeões, judeus, mosaicos, domos brilhantes, rubis e todos os
esplêndidos produtos da Arábia, da China e das Índias", diria, capitaneando as excursões,
caso decorasse o que escreveu.
E os turistas, fotografando a
cidade freneticamente (em Veneza, todo turista descobre um
fotógrafo japonês interior), mal
teriam assimilado as informações e já ficariam sabendo que
"Veneza foi um Estado de grandes homens longevos: Tintoretto morreu aos 76, Guardi aos
81, Longhi e Vittoria aos 83,
Longhena aos 84, Giovanni Be-
llini aos 86, Titian e Da Ponte
aos 88, Sansovino aos 91".
E que "duas facções da cidade, os Nicolotti e os Castellani,
eram tão rivais que a antiga
ponte do Rialto era levadiça,
permitindo às autoridades separar as multidões. Já a igreja
de San Trovaso tinha uma porta em cada lado, uma para o território dos Nicolotti, e a outra,
para o dos Castellani".
A essa altura os turistas estariam, eles mesmos, divididos
em duas facções, os pró e os
contra Jan Morris, e enquanto
isso aprenderiam que "houve
um gato que se tornou uma celebridade internacional no final do século 19. Chamava-se
Nini, e vivia em uma cafeteria
onde havia o livro de visitas a
Nini, em que os clientes assinavam. Quando morreu, em 1894,
poetas, músicos e artistas ofereceram exageradas condolências, e um escultor fez a figura
do animal, que costumava ficar
em uma parede ao lado da loja.
"Nini!", disse um obituário,
"uma jóia rara, a mais honesta
das criaturas'".
E certamente atirariam Morris na água, mas de lá ainda escutariam que, dos 25 primeiros
doges, os governadores, "3 foram assassinados, 1 executado
por traição, 3 cegados pela Justiça, 4 depostos, 1 exilado, 1
morto em uma batalha com piratas..."
(TM)
LIVRO - "Venice"
Jan Morris, ed. Faber and Faber UK,
336 págs., R$ 44,86
Texto Anterior: Frase Próximo Texto: Frase Índice
|