São Paulo, quinta-feira, 27 de setembro de 2007

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VENEZA EM LETRAS

Se guia, Jan Morris seria jogada na água

Autora de um dos principais livros sobre a cidade, escritora inglesa sabe até hora em que ela foi fundada

DO ENVIADO ESPECIAL A VENEZA

Se fosse guia em Veneza, Jan Morris seria seguida por centenas de turistas. Ou jogada no Grande Canal, porque não pararia de falar. Jan Morris deve ser a única pessoa que sabe que Veneza foi fundada em 25 de março de 421 -ao meio-dia.
Inglesa historiadora e escritora de livros de viagem, ela nasceu homem (assinava James Morris) e trocou de sexo na década de 70 (hoje é uma velhinha de cabelos algodoados). Publicou mais de 30 títulos, sobre lugares como Hong Kong, Inglaterra e África do Sul.
Veneza é uma obsessão sua. "Venice", publicado em 1960 e revisado três vezes, é um dos livros mais caudalosos já escritos sobre a cidade italiana.
Sim, os turistas a seguiriam emocionados ou a jogariam para fora do vaporetto. "Veneza era um lugar de seda, esmeraldas, mármores, brocados, veludos, tecido de ouro, marfim, temperos, perfumes, macacos, ébano, anil, escravos, grandes galeões, judeus, mosaicos, domos brilhantes, rubis e todos os esplêndidos produtos da Arábia, da China e das Índias", diria, capitaneando as excursões, caso decorasse o que escreveu.
E os turistas, fotografando a cidade freneticamente (em Veneza, todo turista descobre um fotógrafo japonês interior), mal teriam assimilado as informações e já ficariam sabendo que "Veneza foi um Estado de grandes homens longevos: Tintoretto morreu aos 76, Guardi aos 81, Longhi e Vittoria aos 83, Longhena aos 84, Giovanni Be- llini aos 86, Titian e Da Ponte aos 88, Sansovino aos 91".
E que "duas facções da cidade, os Nicolotti e os Castellani, eram tão rivais que a antiga ponte do Rialto era levadiça, permitindo às autoridades separar as multidões. Já a igreja de San Trovaso tinha uma porta em cada lado, uma para o território dos Nicolotti, e a outra, para o dos Castellani".
A essa altura os turistas estariam, eles mesmos, divididos em duas facções, os pró e os contra Jan Morris, e enquanto isso aprenderiam que "houve um gato que se tornou uma celebridade internacional no final do século 19. Chamava-se Nini, e vivia em uma cafeteria onde havia o livro de visitas a Nini, em que os clientes assinavam. Quando morreu, em 1894, poetas, músicos e artistas ofereceram exageradas condolências, e um escultor fez a figura do animal, que costumava ficar em uma parede ao lado da loja. "Nini!", disse um obituário, "uma jóia rara, a mais honesta das criaturas'".
E certamente atirariam Morris na água, mas de lá ainda escutariam que, dos 25 primeiros doges, os governadores, "3 foram assassinados, 1 executado por traição, 3 cegados pela Justiça, 4 depostos, 1 exilado, 1 morto em uma batalha com piratas..." (TM)


LIVRO - "Venice"
Jan Morris, ed. Faber and Faber UK, 336 págs., R$ 44,86


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