São Paulo, segunda, 28 de julho de 1997.



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O SOL É UMA FESTA
Escritor morou em Key West quando jovem, mas a cidade explora imagem madura na sua casa-museu
Hemingway viveu uma década nas Keys

do enviado especial às Keys

Quando Ernest Hemingway chegou a Key West, em 1928, tinha 29 anos e vinha de Cuba com a mulher, Pauline Pfeiffer, para uma estada de seis meses. Acabou vivendo dez anos na cidade.
O romancista da geração perdida morou, a partir de 1931, num sobrado com paredes de coral no número 907 da rua Whitehead, casa que funciona como museu desde 1964 (aberto diariamente das 9h às 17h, tel. local 294-1575).
O museu é completo até demais, já que exibe uma máquina de escrever -embora se saiba que Hemingway só escrevia à mão.
Dos bares que frequentou, o Sllopy Joe's e o Capitain Tony's Saloon, na rua Duval, ainda vivem em festa explorando a imagem mais conhecida de Hemingway, de barba e cabelos grisalhos.
O curioso é que o Hemingway que morou no extremo sul da Flórida até 1938 era um jovem de bigode discreto, que havia escrito "O Sol Também se Levanta" (1923) e descoberto a fama literária em 1926.
Em Key West, seguia as pegadas de um amigo, o escritor John Dos Passos, que conheceu as Keys na década de 20 e dizia que viajar na ferrovia que Henry Flager construiu era "flutuar num sonho".
Um escritor-personagem
Nascido em Oak Park, Illinois, Ernest Miller Hemingway era filho de um médico e, desde cedo, acompanhou o pai em viagens a territórios indígenas para caçadas e pescarias.
Deixou a escola aos 15 anos e lavou pratos em restaurantes pobres do subúrbio de Chicago.
A vontade de escrever -e de se tornar uma personalidade literária- fez com que Hemingway procurasse emprego como repórter no "Kansas City Star".
Durante a Primeira Guerra Mundial (1914-18), teve seu alistamento recusado. De olho no estrelato literário e nas histórias do front, o escritor não tinha boa visão.
Mesmo assim guiou uma ambulância na Europa em guerra para a Cruz Vermelha e, em 1918, em Fossalta di Piave, na fronteira entre Itália e Áustria, foi ferido e transportado a um hospital de Milão.
Mesmo machucado, teve forças para apaixonar-se por uma enfermeira sete anos mais velha, Agnes Hannah von Kurowsky.
Quando o namoro azedou, Hemingway voltou aos EUA e se casou pela primeira vez.
Mudou então para a França, com a mulher, onde trabalhou para o jornal "Toronto Star" e conheceu os escritores que menciona em "Paris é uma Festa": a poeta Gertrud Stein e F. Scott Fitzgerald.
Mas Hemingway sentia saudades do front -que rende histórias e fama literária.
Foi por isso que percorreu as zonas de conflito da Guerra Civil Espanhola lutando ao lado dos legalistas, esteve na guerra greco-turca, aplaudiu a revolução em Cuba e envolveu-se na Segunda Guerra Mundial.
Com tantas aparições bombásticas, Hemingway cunhou a aura de mito, de um escritor que foi personagem de seu tempo.
Também foi fotografado em safáris na África, em pescarias oceânicas entre Cuba e Key West, vendendo a imagem do caçador de emoções.
Seus escritos fazem parte desse universo, falam do tema da morte como um ritual e contam a história de homens duros. E foram essas histórias que renderam ao romancista o Pulitzer de 1953 e o Nobel de Literatura em 1954.
Com uma personalidade exuberante, o autor de "Por Quem os Sinos Dobram" e "Adeus às Armas" colecionou amantes e amigos com a mesma velocidade que conquistou desafetos.
J. Edgard Hoover, o chefão do FBI, foi um deles. Fichado como "comunista e bêbado", Hemingway chamava essa polícia federal de "Gestapo americana".
Talvez torturado pela chegada da velhice, o romancista foi vítima de si mesmo. Entusiasta das touradas, do boxe e das brigas de galo, Hemingway suicidou-se com um tiro de espingarda a 2 de julho de 1961, numa fazenda de Ketchum, Idaho. (SILVIO CIOFFI)


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